A Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC) publica artigo de autoria do Juiz Luiz Fernando Boller. O artigo é intitulado “Tráfico internacional de pessoas: moderna forma de escravidão”.
Tráfico internacional de pessoas: moderna forma de escravidão
Por Luiz Fernando Boller, juiz Diretor do Foro da comarca de Tubarão (SC)
No último dia 18 – na operação “Caraxué” (explorador da prostituição) – a Polícia Federal prendeu em SP, MG e SC, dez acusados de envolvimento em uma quadrilha de exploração sexual que, só neste ano, enviou 40 travestis para prostituição na Europa.
A organização recrutava travestis em todo o Brasil – por indicações e pela Internet – aliciando travestis para a prostituição na Itália (Milão, Roma e Florença) e na Espanha (Zaragoza, Pamplona e Madri), cobrando cerca de R$ 30 mil pela passagem e uso de pontos de prostituição, além da hospedagem e alimentação.
Para que não voltassem ao Brasil sem pagar a dívida, os homossexuais tinham os passaportes retidos.
Cinco dos presos são travestis. Elvis Osório de Araújo, conhecido como “Lorraine”, é o líder do grupo. Tem casa em Milão, usada para abrigar aliciados. Foi preso em uma chácara com quatro piscinas em Uberlândia-MG.
Já Vilmar Rodrigues Cardoso, conhecido como “Pâmela”, foi preso em uma casa de praia em Palhoça-SC. Cardoso estava na Itália, levando aliciados.
Responderão pelos crimes de rufianismo (proveito da prostituição alheia), tráfico de mulheres e formação de quadrilha. As penas vão de um ano a oito anos de prisão.
Para introduzir os travestis na Europa – visto que há um grande fluxo de travestis para Milão, e a imigração italiana costuma deportá-los – a máfia do tráfico de pessoas usava rotas com menos chances de deportação: de avião até Suíça, Holanda ou França e de carro ou ônibus até Milão e Madri.
Recente relatório do Departamento de Estado norte-americano afirma que o Brasil “exporta” prostitutas brasileiras para 12 países: Estados Unidos, Argentina, Alemanha, Itália, Japão, Holanda, Paraguai, Portugal, Rússia, Espanha, Suíça e Reino Unido.
Além do tráfico interno de pessoas e também de prostitutas, o Brasil é mencionado no relatório, inclusive, pela “exportação” de travestis, estes especialmente para a Europa e Ásia, tecendo críticas a falta de assistência do governo brasileiro às vítimas de exploração sexual – na maioria, mulheres e crianças.
Em todo o mundo, estima-se que sejam entre 700 mil e 4 milhões de vítimas anuais.
A máfia do tráfico usa intimidações e ameaças para levar as pessoas a uma situação próxima à da escravidão. Também há seqüestros de crianças e a venda de mulheres e meninas como empregadas domésticas.
Recentemente, um dos líderes da máfia de traficantes de pessoas – o turco Ramazan Zorlu, de 43 anos – foi condenado pela Justiça britânica, a oito anos e meio de prisão por liderar uma complexa rede que encaminhava centenas de prostitutas e travestis para a Grã-Bretanha.
Na mesma ocasião, foi preso Ali Riza Gun, de 47 anos, também envolvido no tráfico de pessoas, “esquema” que movimentava milhões de euros.
Ouso recomendar ao futuro presidente e novos governadores, a necessidade de combate à esse tipo de crime, investigando e perseguindo ativamente, com eficácia opondo-se ao tráfico de pessoas – para fins sexuais ou de exploração do trabalho – melhorando a prevenção, com proteção às vítimas e persecução aos facínoras.
Aliás, relatório da UNFPA (Situação da População Mundial do Fundo de População das Nações Unidas) mostra que o tráfico de pessoas é a terceira atividade ilícita mais lucrativa do planeta, perdendo, apenas, para os comércios de drogas e de armas. O número de vítimas, entre homens e mulheres, chega a 2,45 milhões.