Perfil – Desembargador aposentado Nauro Luiz Guimarães Collaço

A Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC) disponibiliza o perfil do Desembargador Nauro Luiz Guimarães Collaço, que faleceu ontem (21/5), em Florianópolis. O texto, que também está disponível no site da AMC (www.amc.org.br), foi publicado originalmente em dezembro de 2009, no jornal O Judiciário. Confira:

Desembargador aposentado Nauro Luiz Guimarães Collaço: minhas memórias, minha vida…

“Minha Terra Natal é Tubarão, donde saí aos onze anos de idade, após cursar o primário no Grupo Escolar Hercílio Luz. Sou filho de pai tubaronense, João Luiz Collaço, e mãe lagunense, Maria Conceição Guimarães Collaço. Tenho a impressão de que não se consegue esquecer o local onde se nasce, pois lembro bastante de Tubarão, a minha “Cidade Azul”. Não sei por que lhe davam esse nome, mas gosto de repeti-lo e sinto que tenho raízes fixas lá, apesar de poucos anos de vivência naquela cidade.

Depois fui para Laguna cursar o ginásio. Morava na casa do meu tio, Bernardino Guimarães, irmão de mamãe. Laguna era a principal cidade do sul do Estado. Era a única que tinha Ginásio naquela época. Muitos anos depois voltei para lá como juiz. Exerci a judicatura naquela bela cidade, de povo bom e culto, durante um ano, quando, então, me transferi para Lages. Meus laços com aquela cidade eram profundos, começando pela maternidade. Deixei-a com saudades. O passo seguinte foi Florianópolis. O Sul não possuía cursos secundários. A família veio morar aqui. A acolhida que tivemos por nossos tios Born e Gualberta, ela irmã de mamãe, é impossível de agradecer, dada a bondade e modo carinhoso com que nos trataram. Antes falei em Tio Bernardino e, agora, em tio Born e tia Gualberta. Não é “ranço” de um velho magistrado… É a oportunidade de, citando-os, agradecer tudo que fizeram por nós (família), possibilitando-nos seguir nos estudos. A insistência que fizeram para que viéssemos para cá foi fundamental para a nossa formação profissional. Bem, aqui cursei o Científico no Colégio Catarinense. Tempo bom, com futebol, estudos e os prazeres da Capital que, já naquela época, se não era uma cidade grande, oferecia muitas das vantagens dessas. Quando me formei no científico papai não mais existia… Chegou o período da Faculdade de Direito. Nessa época já me considerava um filho da terra. Um “manezinho” nato. E hoje ainda o sou. Também, depois de setenta anos vivendo com a família radicada neste pedacinho maravilhoso de terra, quem não seria? Encerrada a Faculdade fui para Criciúma advogar pelo Sindicato dos Mineiros. Lá permaneci um ano. Voltei para Florianópolis para fazer o concurso para juiz substituto e juiz de Direito. Enquanto aguardava a realização do concurso preparava-me para o concurso, advogava e trabalhava.

Minha primeira comarca como juiz de Direito foi Mondaí, no extremo oeste catarinense, depois de percorrer várias comarcas como substituto. Chegou a hora de viajar para o Oeste. Várias foram as substituições, mas a emoção nos atingia, sabendo que íamos iniciar a carreira como juiz de Direito. Já estava casado e a minha primeira filha tinha sete meses de idade. Sabíamos que a viagem era longa, demorada e, até, penosa, mas o mais preocupado era eu. Juçá sentia-se bem e contente; parecia uma aventura. Marise (a filha), lógico, nada entendia sobre o que se passava. O hotel da cidade, em Mondaí, no ano de 1959, era um pouquinho pior do que se esperava. Mas havia uma casa para juiz. Nossa mudança foi só o tempo de comprar uns móveis, pois daqui nada levamos. A casa era de madeira, não tinha banheiro. O banho era em um chuveiro que tinha uma lata mais acima, onde se colocava a água quente. Sanitário também na existia. A latrina ficava há uns trinta metros da casa. Quando chovia era uma tristeza, porque o terreno era bastante escorregadio… Minha segunda filha, Luciane, nasceu aqui em Florianópolis, num mês de julho, em que eu estava presente, pois era mês das férias coletivas (janeiro e julho). Assim, voltamos para Mondaí com a famí¬lia um pouquinho maior, mas com a mesma vontade de trabalhar. Poucos meses depois de assumir a comarca de Mondaí, que era a comarca sede do extremo oeste, o Tribunal desmembrou-a, criando a de São Miguel do Oeste. Optei por permanecer em Mondaí que ficou com o município de Itapiranga, enquanto São Miguel do Oeste, como sede também de comarca, ficou com os municípios de Cedro, Descanso e Dionísio Cerqueira. Restou-me, portanto, trabalhar com os dois municípios fronteiriços ao Rio Grande do Sul. Itapiranga e Mondaí eram colonizações alemãs, mas com uma característica toda especial. Enquanto Itapiranga era habitada por alemães católicos, Mondaí era protestante. Mas não havia qualquer rivalidade entre os municípios. A paz era muito grande. E essas características continuavam com os municípios seguintes, em direção ao leste. Palmitos era colonização católica e Descanso era protestante. De Mondaí vim para Turvo. Surpresa muito grande ao constatar a semelhança com Mondaí, num ponto somente: ambas não tinham luz elétrica. A iluminação era produzida por um motor a diesel, que funcionava 10 dias, das 8 às 10 da noite, e depois parava por outro tanto. Quebravam sempre. Em ambas era assim. Quando saí de Mondaí foi inaugurada a rede elétrica. Por coincidência, o mesmo aconteceu quando deixei Turvo, onde com um grupo de pessoas que tinha interesse na educação de seus filhos, conseguimos fundar um ginásio naquela cidade, tendo completado, há pouco mais de dois anos, meio século. Não pude comparecer às comemorações… De Turvo para São Joaquim, posso dizer que passei em branco, porque foi bastante rápida a mi¬nha estada naquela comarca. Pela primeira vez a família não me acompanhou. A comarca de Orleans estava vaga e como não havia nenhum candidato que a pretendesse, pedi remoção e o Tribunal atendeu ao meu pedido. Orleans foi outra comarca muito gostosa. Povo também muito bom, ordeiro e alegre. Juçá, Marise, Luciane e eu a deixamos depois de dois anos, sentindo saudades… Rumávamos outra vez para o oeste. A comarca de Concórdia nos abrigaria por um ano. Outra co¬marca muito boa para trabalhar, também com um povo feliz, correto e simpático. Viemos para Laguna. Aqui rememorava um pouco da minha infância e adolescência. A proximidade do mar, parece, atraia, tanto a mim, como a Juçá, Marise e Luciane, além do que estávamos próximos do resto da família. Jaymor exercia a sua função de juiz na comarca de Biguaçu. A sua proximidade me era muito útil, tanto pelos seus conhecimentos, como pelo seu modo de agir. Muito lhe devo, desde o início da carreira.

Laguna já fora um marco inicial na minha infância, pois ali fizera o Ginásio e, agora, sairia para uma comarca de 4ª Entrância, bandeira de todo juiz naquela época, já que era o máximo a ser almejado pelos juízes, pois era a proximidade futura com a Capital. Já gostava muito de Laguna. Aumentaram os meus sentimentos por aquela terra boa e amiga. Passamos as férias do mês janeiro lá. Alugamos uma casa na praia, e os familiares daqui de Florianópolis foram nos fazer companhia. Foi uma temporada muito gostosa. Naquela ocasião (ano de 1966) siris, ao morrer da tarde, vinham com as ondas para a praia. E esta ficava salpicada de pontos acinzentados e, com uma “coca” – que nada mais é do que uma rede em forma de coador de café, presa a um arco de ferro e este a um cabo de madeira – eram presas fáceis e fartas. E eram quase que exclusivamente fêmeas que vinham com as ondas para a praia… E os lagunenses diziam que eram mais gostosas do que os siris machos… De Laguna para Lages. Cidade em desenvolvimento, a “Rainha do planalto serrano”. Comarca de 4ª Entrância. Três Varas, sendo duas cíveis e uma criminal. Pela primeira vez iria trabalhar com mais dois colegas. E como gostei!!! Formávamos com os promotores de Justiça (naquela época com a nomenclatura de promotor público) uma família forense muito amiga, entrosada e procurando minimizar os problemas que por lá existiam. Com relação à Vara Criminal, a preocupação era muito grande. Lages havia “roubado” de Curitibanos, não há muito tempo, a coroa de Comarca com maior número de assassinatos. Era difícil entender como um povo tão bom como aquele podia ostentar aquele título. Não há gente melhor. Igual pode haver. Mas, depois de um tempo, e de várias reuniões, veio a explicação lógica: município muito grande, muitas “fazendas” e era comum a reunião de “peões” nas “bodegas” nos dias de folga. A bebida alcoólica, quente, tornava fácil a discussão. A arma – revólver, facão, etc. – era usada como adereço obrigatório, e isso facilitava, na hora da briga, o resultado fatal. O mesmo ocorria na cidade. O revólver era ostentado sem qualquer intenção de escondê-lo.

E Lageano era “macho”. Qualquer desavença tinha resultado funesto. Ninguém aceitava voltar para casa após ouvir desaforos sem lavar a honra. A providência era desarmar e julgar os que estavam com processos de homicídio doloso em juízo. O desarmamento daqueles que usavam armas na rua começou com um trabalho muito bem feito pelo delegado Gil Saut, um jovem com índole perfeita para o cargo: educado, gentil, inteligente, cônscio dos seus deveres, honesto e que aderiu à campanha logo de início. Começado o desarmamento, houve a intenção de, por meio político, conseguir a arma apreendida de volta. Como não conseguiam, preferiram não perder mais suas armas. Por outro lado, começamos os julgamentos dos processos de homicídio. Inúmeros foram os julgamentos populares realizados e para os quais a sociedade de Lages comparecia, lotando as dependências do Fórum e apoiando de maneira muito clara as providências que estavam sendo tomadas. Outro problema muito sério era a enorme zona do meretrício, muito junto ao coração da cidade, onde a freqüência podia ser feita a pé. Fizemos reuniões também para afastá-la do centro. Apesar dos quatro anos que permaneci na Comarca, deixei-a sem que essa providência tivesse se efetivado. Mas, depois, não demorou muito, a mudança foi realizada. Nessas providências não faltaram o apoio de vários advogados, do Prefeito Municipal, Nilton Neves, e muitos outros. Faz tempo que não revejo Lages. Mas foi uma comarca encantadora. Foram quatro anos de muito trabalho, mas, proveitosos. Talvez a minha parte sentimental tenha influído nesta simpatia pela cidade. Minha Avó paterna era natural de Lages e aos sete anos de idade desceu a serra em lombo de mulas para morar em Tubarão, onde casou com Vovô. Quanto tempo faz isso??? Muito. Ela faleceu aos 99 anos de idade, há mais ou menos 65 anos. Muita coisa poderia, ainda, dizer sobre Lages, mas, vamos viajar para Florianópolis, para onde fui removido, para a 3ª Vara Cível, no ano de 1971… Voltei ao meu chão predileto. Só o fato de conviver com a família, em definitivo, já compensava as mudanças e andanças feitas pelo Estado. Restariam as lembranças e saudades. O período na 3ª Vara Cível foi muito bom. Há quatro anos trabalhando unicamente na Vara Criminal, voltava a uma expe¬riência que se pode chamar de nova. Em Lages não tinha chance de passear pelo Direito Civil. Havia um excesso de serviço na Vara Criminal. Pouco tempo depois da minha posse, o Direito Processual Civil passou por uma reforma. Parece até que tudo ficou mais fácil, pois era tudo novo para todos. Um escrivão muito bom, chamado Secundino dos Anjos, facilitava muito o serviço, e quando fomos removidos para a Vara de Substituição no Tribunal, tive o prazer de entregar a 3ª Vara Cível de Florianópolis em boas condições ao saudoso amigo e colega exemplar, o desembargador Márcio Batista da Silva. No Tribunal, como juiz substituto de desembargador, era o quarto membro da 3ª Câmara Cível. Os desembargadores que a compunham já não estão mais entre nós. Foram, porém, de uma gentileza máxima comigo; não pouparam incentivos ao meu trabalho. Serei eternamente grato a eles. Quando assumi efetivamente como desembargador do nosso Tribunal, continuei na mesma Câmara. Posteriormente fui transferido para a Câmara Criminal.

O período de Tribunal foi bastante gratificante. Participar do Tribunal Pleno, para mim, foi emocionante, mas desgastante. Até a última das sessões em que ali estive, depois de vários anos, ainda ficava nervoso. E quando me manifestava parece que as palavras atropelavam o pensamento e passavam para frente da fala. Admirava-me dos colegas que falavam calmamente, saboreando as palavras e dando perfeito entendimento aos seus pensamentos. Eu tentava colocar o início do que ia dizer o mais perto possível do ponto final; fazia esforço para não me manifestar, mas não conseguia… A saudade desse tempo é bem grande, apesar do muito trabalho. Nós, os das Câmaras Criminais, mantínhamos os nossos serviços em dia, mas os das Câmaras Civis, não conseguiam. E era humana¬mente impossível fazê-lo. O grande número de processos impedia o andamento mais célere dos processos. Imaginem ler um processo de 200 páginas – geralmente os que sobem ao Tribunal tornam-se volumosos, relê-los, examiná-los cuidadosamente, procurar a doutrina e a jurisprudência, não pode ser coisa de pouco tempo, principalmente, quando são centenas, e até milhares de processos para cada membro. Talvez, por isso, eu seja corporativista. A Justiça, como se costuma dizer, jamais será defendida pela sociedade; os juízes, por isso, têm que se proteger. Exemplifico: são sempre duas partes que litigam em juízo: autor e réu. O primeiro ingressa com a ação porque acha que a “coisa” pretendida é sua. O outro contesta pelo mesmo motivo: o objeto litigioso é seu. Se a ação for favorável ao autor este não tem porque falar bem da Justiça. O bem em discussão era seu e a Justiça não fez nada de mais (no que tem razão), enquanto o réu, por sua vez, que também se supunha o dono da “coisa”, fica revoltado e, é óbvio, nada de bom irá dizer. Leve-se em conta, ainda, as despesas feitas, o vai e vem para os escri¬tórios dos advogados, as idas a juízo e o tempo que levará para ver concluído o seu embate na Justiça. Nenhuma das partes, em geral, fica satisfeita. É de se admitir que eles têm razão… Daí, só resta ao próprio Judiciário fazer a sua defesa e proteger-se, trabalhando muito e fazendo um convívio mais profundo com a sociedade, mostrando-lhe os problemas que emperram o “fazer justiça” e atendê-la afetivamente para que ela possa sentir melhor o trabalho do magistrado. O perfil do magistrado catarinense é muito bom. É dos melhores. Pode haver igual, mas que seja superior não, não há… A permanência no Tribunal foi altamente gratificante. Exerci as funções de vice-presidente e corregedor. Nesses cargos lidei bastante com os juízes, e conhecendo bem as agruras do exercício da função pelo interior do Estado, conhecendo os seus desem¬penhos, conhecimento e vontade de trabalhar, é que afirmei, e agora reafirmo com muito entusiasmo, o juiz catarinense é MUITO BOM, com letra maiúscula mesmo!

Quando andava pelo interior, mesmo como juiz substituto, sempre estive ligado ao serviço eleitoral. Durante estes períodos participei da nova qualificação eleitoral, quando foram mudados os títulos eleitorais. Depois, nas comarcas com Vara única, a função era obrigatória. Quando estava em Lages, a oportunidade de não fazer a eleição esvaiu-se ao ser convidado pelo Tribunal Eleitoral para realizar a eleição em Chapecó. Pouco tempo depois de vir para a Capital, fui indicado para ser juiz eleitoral, na classe de juiz, onde permaneci por quatro anos. Depois, mais dois anos quando ocupava a Vara de Substituição e, depois, ainda, outros dois anos como desembargador, ocupando, primeiro a corregedoria e, em seguida, a presidência do Tribunal Eleitoral. Enquanto eu era corregedor, ocupava a presidência do TRE o meu grande amigo Hélio de Mello Mosiman. Magistrado exemplar, trabalhador incansável, inteligente, culto, que colocava todo o seu vigor no seu trabalho, o que, mais tarde, fez com que galgasse ao cargo de ministro do Superior Tribunal de Justiça. Começávamos, nessa ocasião, a sonhar com a eleição eletrônica. Assumi a presidência do Tribunal e o desembargador Napoleão, inteligência respeitável, a Corregedoria. O sonho continuava, mas vimos que era muito cedo para realizar a eleição eletrônica. Teria que ficar para o ano seguinte ou, talvez, dois anos mais tarde. A segurança do voto em urna eletrônica era primordial. Iniciaríamos, então, pela apuração eletrônica. Realizamos uma grande eleição: federal, estadual e municipal, com apuração eletrônica. Foi um trabalho hercúleo, mas totalmente satisfatório e para servir de exemplo. Era diretor executivo do Tribunal o meu irmão Márcio. Dedicava-se total e plenamente aquele Órgão. Planejara o trabalho de apuração eletrônica das eleições. O Tribunal Eleitoral possuía um corpo de funcionários invejável. A dedicação de todos era contagiante. Queríamos dar o resultado o mais rapidamente possível. As 6hs, depois de trabalharmos a noite toda, estávamos com tudo pronto. Telefonamos para Brasília para passar para o Tribunal Superior o resultado. Um funcionário avisou que àquela hora não era possível, não havia nenhum funcionário que pudesse atender, somente às 8hs. Retornamos um pouco depois desse horário, e a voz de lá, depois de lhe passarem o telefone, disse: o que é que vocês querem? Qual é o problema agora? E eu respondi: nada não, é só para passar o resultado das eleições. Pode começar a anotar. Espera, espera…

Um pouco mais tarde o ministro Sidney Sanches telefonava cumprimentando o nosso Tribunal. Manifestações vieram, ainda, de outros ministros. Daí por diante o nosso Tribunal passou a ser, orgulhosamente, o líder das apurações eletrônicas no país, e pouco tempo depois, nas eleições e apurações eletrônicas. O trabalho desenvolvido pelos juízes nessa primeira eleição foi algo extraordinário. Todos incorporados no sucesso daquela empreitada. Houve um juiz eleitoral, em Curitibanos, na época, parece-me, sabendo de um problema que houve numa comarca que deveria levar o resultado para Curitibanos, não hesitou em colocar o seu carro na estrada para, trazendo o resultado de lá, transmiti-lo para nós no Tribunal. Mérito ao Márcio e aos meus queridos funcionários daquele Tribunal que não se furtaram a passar a noite acordados para que a apuração estivesse completa, com os mapas prontos, em menos de 12 horas. Parabéns a todos vocês, Juízes Eleitorais daquela Eleição, a todos os funcionários desse egrégio Tribunal. Ao Márcio, meu irmão querido, o meu agradecimento póstumo de público. Ele sabia quanto o admirava e deveria saber que o mérito era todo dele, mas sua modéstia entregava todo o sucesso aos seus funcionários. Saudades também do Tribunal Eleitoral… Quando retornei à Capital senti-me envolvido com a Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC). Fazia parte da diretoria como conselheiro. Parece que o fato de ter lavrado a ata de fundação da Associação, em data de 20 de fevereiro de 1961, colocava-me na obrigação de auxiliar o desembargador Euclides de Cerqueira Cintra, então Presidente. A Associação era ainda muito fraca, apesar de o grupo associativo ser quase a totalidade dos magistrados. Suas reivindicações em benefício da classe eram feitas por um pequeno grupo de magistrados, geralmente nas férias, com os juízes que aqui aproveitavam o descanso. As realizações associativas resumiam-se ao encontro de fim de ano, quando, em Assembleia Geral, eram apresentadas várias reivindicações, e depois a parte festiva, com um almoço. E mais não podia ser feito. As mensalidades pagas pelos juízes eram muito pequenas e só podiam cobrir as despesas com essa reunião. Nessa gestão do desembargador Cintra, a AMC conseguiu, por doação, com o governador Colombo Machado Salles, o terreno onde hoje está a sede balneária. Foi uma dificuldade cercar o terreno com uma cerca de arame farpado, exigência obrigatória da doação; caso contrário o terreno voltaria para o Estado. A cerca serviu para demonstrar a nossa posse naquela área de quase cem mil metros quadrados. Desembargador Cintra permaneceu na presidência por 10 anos. Era um apaixonado pela Associação e esta muito lhe deve. Foi ele, juntamente com Jaymor Guimarães Collaço e Dalmo Bastos Silva, que iniciaram o movimento para fundar uma Associação, a exemplo do que já fizera o vizinho Estado gaúcho. Receberam o incentivo dos desembargadores Eugênio Trompowski Taulois, Osmundo Nóbrega, Hercílio Medeiros, José Bastos, Belizário Ramos da Costa, Arno Hoeschel, entre outros, além do juiz substituto nesta Capital, Valdemiro Cascaes. Do interior apareciam os incentivos e, durante as férias, os juízes que para cá vinham passar alguns dias, engajavam-se às ideias e fortaleciam cada vez mais aquele sonho. Era o caso do Timóteo, juiz em São Bento do Sul. Os dois primeiros presidentes da entidade foram os desembargadores Bastos e Belizário Ramos da Costa. Depois, o período de dez anos do desembargador Cintra, que não queria onerar mais o bolso do magistrado com um pequeno aumento nas mensalidades. Veio, então, o período do desembargador Hélio Mosimann. Continuei como secretário da AMC. Realizamos uma Assembleia muito concorrida, propusemos e conseguimos um aumento nas mensalidades; era preciso dar corpo à sede balneária. E assim foi feito. Foi construído o Salão de Festas da Associação e, muito importante, aquilo que ninguém vê: o aterro de metade do terreno. Ali era um banhado, onde dez caçambas de caminhão não pareciam aterrar quase nada.

Chegou a minha vez. Assumi a presidência da entidade. A pretensão era continuar lutando para aumentar e dar mais força à Associação e criar na sede um ambiente que atraísse mais os associados. Para isso era preciso criar ambientes em que grupos participassem de lazeres coletivos. Construímos um campo de futebol, outro de vôlei, uma cancha de bocha, quatro canteiros com oito boxes para barracas, estacionamento para trailers e uma piscina. A construção da piscina foi épica. Do pequeno lago que abrimos, aproveitando a passagem do riacho que percorria pelo terreno, aproveitávamos a terra que dali tirávamos para aterrar as laterais da piscina, que foi construída acima do nível do terreno porque este tinha muita água e seria muito cara a impermeabilização. O importante disso é que a terra transportada para aterrar a piscina era levada em carro de boi, carroças e carrinho de mão. Por isso disse que foi épica a sua construção. Os nossos empregados da época foram heróis e gigantes no trabalho que desenvolveram. A construção da piscina só foi possível em virtude do prestimoso auxílio de meu sobrinho, Eduardo Collaço Paulo, engenheiro, hoje, também, advogado militante. Aurélio Remor, prestimoso engenheiro do Depto. de Portos e Canais, assessorou-nos na construção do lago. Outra providência necessária era o plantio de árvores. O terreno era um pasto raso e a sombra fazia falta. Plantamos muitas, numa luta incessante contra as formigas e outros fatores… Importante ressaltar também que neste período conseguimos implantar a rede elétrica e hidráulica, pois antes a nossa iluminação provinha de um poste do terreno vizinho de forma precária. As próximas gestões da nossa Associação ficam para ser contadas pelos seus Presidentes. Todos, sem distinção, são dignos dos nossos elogios, pois souberam elevar o nome da nossa entidade, transformando-a numa referência entre as suas congêneres no país. Ao colega Paulo Bruschi, atual Presidente, que vem fazendo um trabalho muito bom, o meu abraço e a minha força para que continue no seu trabalho tão a gosto de todos nós. Não posso me furtar aqui, já que o assunto é a Associação, a uns agradecimentos necessários. Ao governador Colombo Machado Salles, que doou o terreno para a construção da sede. Tive a oportunidade de, em uma Assembleia Geral, muito concorrida, com a sua presença e da sua esposa Deise, agradecer a oportunidade que proporcionou aos juízes, permitindo-lhes o prazer de férias mais saudáveis e agradáveis. A segunda homenagem ao Executivo foi para o governador Henrique Córdova. Com ele, conseguimos a lei que estabeleceu a percentagem de 4% no orçamento do Estado para o Tribunal de Justiça. O Tribunal fugia, assim, daquela obrigação incômoda de pedir todos os meses a verba para pagar a folha de pagamento dos magistrados e funcionários. Ressalte-se, aqui, de modo bem expressivo, o empenho do desembargador May Filho, presidente do Tribunal na época, que envidou todos os esforços para que essa pretensão, que era de toda a magistratura, se efetivasse. Da mesma forma, contamos com o empenho do desembargador Ivo Sell, Secretário da Fazenda do governador Córdova, que foi mais que relevante para a consecução dessa pretensão. A todos eles o meu muito obrigado.

Como é que eu me retrato? Acho que sou uma pessoa simples, não gosto de usar sapatos nem gravata, sou sincero, continuo sem gostar de aparecer e falar em público; se cometi erros, o que por certo aconteceu, já que todo mundo erra, foi sem a intenção de cometê-lo. Sinto-me realizado e orgulhoso. Orgulhoso por ter dois sobrinhos na nossa magistratura. Rodrigo Tolentino Carvalho Collaço e Mônica Bonelli Paulo. Rodrigo tem dado mostras de sua inteligência, capacidade de trabalho, correção, senso nos seus julgamentos e vários outros predicados. Exerceu a presidência das Associações dos Magistrados Catarinenses e Brasileiros, onde demonstrou um espírito de classe elevadíssimo, batalhador e capaz. Mônica é filha de Eduardo, este filho de minha irmã Liene Collaço Paulo, o que construiu a nossa piscina. Ela é juíza substituta. Sei que será muito bem sucedida. Interesso-me por sua carreira e, por isso, tenho conhecimento do trabalho que vem fazendo nas comarcas por onde passa. Esse orgulho, provavelmente, permanecerá por muito tempo, pois tenho dois netos cursando a faculdade de Direito – Bruno e Victor – nos quais deposito muita confiança, bem como às minhas netas, Maria Augusta, que fará o vestibular para Odontologia este ano, e Betina, que cursa o segundo grau no Colégio Catarinense, esportista por excelência, filha de Luciane e Marcos Antônio de Oliveira, a qual herdou do pai essa qualidade. Quero deixar claro, também, o meu agradecimento a todos os escrivães com quem trabalhei, aos funcionários dos Fóruns e do Tribunal, pois a eles devo muito do meu desempenho em minha carreira. Aos promotores públicos e de Justiça, amigos indiscutíveis, ofereço o meu abraço irmão. Muito me ajudaram no meu mister. Registro, finalmente, o meu maior agradecimento a minha família, que sempre me incentivou e apoiou durante esse longo período de trabalho, árduo, porém gostoso. À Juçá, Marise e Luciane, que percorreram comigo o Estado, e que nunca reclamaram de sair daqui deste lado do Brasil (da ilha) para ir para o outro extremo do país, no extremo oeste, fronteira com a Argentina, o meu abraço, pois aqui não cabe agradecimento, este é insuficiente para dizer o que devo. Tenho a certeza de que fariam tudo de novo…”.

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