Congresso de Direito Eleitoral debate as principais regras para as eleições deste ano

Durante os dois dias (12 e 13/05) do Congresso de Direito Eleitoral, promovido em parceria pela Escola Superior da Magistratura do Estado de Santa Catarina (ESMESC), Escola Judiciária Eleitoral de Santa Catarina (EJESC) e Escola do Legislativo Deputado Lício Mauro da Silveira, Advogados, pré-candidatos, servidores e representantes do Ministério Público e do Poder Judiciário debateram os aspectos polêmicos da Lei 13.165, tais como a proibição de doações de pessoa jurídica, registro de candidatura, inelegibilidades, condutas vedadas e propaganda eleitoral. O evento foi realizado no Auditório Antonieta de Barros, na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC).

Um dos coordenadores do evento, o Professor de Direito Eleitoral da Escola de Magistratura, Mauro Prezotto, destacou que a legislação eleitoral sofreu diversas alterações em 2015 (Lei 13.165), as quais serão aplicadas pela primeira vez nas eleições de outubro de 2016.  “É um momento ímpar para debater as alterações da legislação eleitoral, especialmente após esse acontecimento histórico, que foi o segundo impeachment presidencial no país”, disse. Prezotto frisou que as eleições municipais são as mais importantes no contexto democrático porque nelas são escolhidos os gestores que atuam mais próximo dos cidadãos.

A conferência de abertura do congresso abordou o tema “Reforma política e democracia”. Professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Procurador do Estado de Pernambuco, o conferencista Walber Agra abordou as formas de implementação de uma democracia efetivamente participativa, pela qual o povo seria o ator principal do processo democrático. “Os últimos eventos, na Câmara e no Senado, mostraram que o povo não é o ator principal, mas o coadjuvante”, frisou. Na visão dele, o momento atual exige reflexões. “Estamos em crise, então, algumas decisões nesses momentos de crise são açodadas. O povo precisa, obviamente, participar, e não apenas uma elite, que na maior parte dos casos não é uma elite meritocrática, mas uma elite imposta, uma elite econômica”, argumentou.

Registro de candidatura

Iniciando os trabalhos da tarde, especialistas em Direito Eleitoral alertaram para a insegurança que cerca o registro de candidatura daqueles que têm contas rejeitadas em decisão transitada em julgado pelos tribunais de contas. “Tem rejeição de contas? Trata-se de irregularidade insanável? A conduta foi dolosa? Aí temos um problema sério: existe espaço no registro de candidatura para que o candidato comprove que não há elemento subjetivo para caracterizar como ato doloso?”, questionou o Professor da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Flávio Cheim Jorge.

Para o Professor, a lei da Ficha Limpa criou uma armadilha jurídica. “Acrescentou na alínea “g” (inciso I, artigo 1º da LC 64/90) algo que não tinha antes: o dolo, mas a conduta dolosa é mais difícil de configurar, por isso dificultou a defesa dos direitos do candidato”, avaliou Cheim.

Segundo ele, que também advoga na área, um candidato com contas rejeitadas não tem certeza se obtém o registro. “Como afasto essa incerteza? Posso ajuizar ação declaratória na Justiça Comum”, especulou Cheim, ponderando em seguida que no caso da Justiça Comum decidir que houve dolo dificilmente a Justiça Eleitoral aceitará o registro.

Para o Professor de Direito Eleitoral da Univalli, Luiz Magno Pinto Bastos Junior, a nova redação dada à alínea “g” pela lei da Ficha Limpa criou dificuldades para a Justiça e incerteza para os candidatos. Magno destacou a dificuldade de aferir se a conduta foi ou não dolosa a partir da descrição contida no acórdão dos tribunais de contas. “Tenho de extrair do que tenho (o acórdão) a conduta imputada, tenho que identificar a conduta dolosa”, explicou o professor.

Além disso, segundo Magno, o Tribunal Superior Eleitoral já consagrou a tese do dolo específico, isto é, o Juiz terá de demonstrar a intenção do agente em burlar a lei no caso concreto para indeferir o registro. “Tem o elemento de má fé, então precisa identificar onde está a má fé. Isso vai exigir do Magistrado que especifique nos elementos do (acórdão) onde está a desonestidade”, afirmou o Professor da Univalli.

Na mesma tarde, foi realizado o painel “Sistema eleitoral em crise?”, com a participação dos Professores e Advogados Cesar Luiz Pasold e Rogério Duarte Silva e o Juiz Fernando de Castro Faria, tendo como coordenadora de mesa, a professora Solange Buchele de S. Thiago. Após explanar sobre os principais tópicos da Reforma Política, o Juiz Fernando de Castro Faria destacou o baixo índice de confiabilidade da sociedade na classe política. “As pessoas não confiam mais nos partidos políticos. Ou os partidos se reinventam ou haverá um colapso”, frisou. Já o professor Rogério Duarte ressaltou a importância do momento político atual. “Muitos dizem que estamos vivendo um período dramático, de terra arrasada. Eu penso diferente. Acho que estamos começando a construir a nossa democracia”, apontou. Ele também defendeu a possibilidade de candidaturas avulsas, posição que também foi acompanhada pelo professor Cesar Pasold.

Abuso de poder

Temas como abuso de poder, condutas vedadas, compra de votos e fraude pautaram a palestra de abertura do segundo dia de atividades do Congresso de Direito Eleitoral, cuja mesa foi presidida pelo Juiz Giuliano Ziembowicz. Os temas foram abordados pela Advogada especialista em Direito Eleitoral e Direito Público pela Universidade Federal do Estado do Piauí Geórgia Nunes. “São práticas que desvirtuam a igualdade de condições entre os candidatos no pleito. É importante tratar desses assuntos para que candidatos, partidos, coligações e operadores de Direito envolvidos nas campanhas estejam atualizados".

Ela destacou a nova norma para despesas publicitárias de órgãos públicos em anos eleitorais. De acordo com a Lei Federal 9.504, de 1997, que teve sua redação alterada pela Lei 13.165, de 2015, os agentes públicos estão proibidos de realizar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos no primeiro semestre dos três últimos anos que antecedem o pleito.

Propaganda eleitoral

Segundo a nova regra do artigo 240 do Código Eleitoral, a propaganda de candidatos a cargos eletivos somente é permitida após o dia 15 de agosto do ano da eleição. Antes, essa propaganda podia ser iniciada após a escolha dos candidatos em convenção.

As principais regras para propaganda eleitoral na internet foram tratadas no segundo painel da manhã de sexta-feira, que contou com a participação de Servidor do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba, Alexandre Basílio, e do Advogado Guilherme Gonçalves, em mesa coordenada pela Juíza Eleitoral Ana Cristina Ferro Blasi. “Ela representa dificuldades devido à interdisciplinaridade. Para trabalhar nessa área é necessário o mínimo de noção de mídia social e de funcionamento de internet. Por exemplo: termos como URL, podcast, twitcast, tudo isso são problemas que chegarão em forma de ações para que os juízes eleitorais resolvam e também para os advogados realizarem as defesas”, disse. “Tendo em vista as últimas mudanças da Lei 13.165, que fizeram uma abertura de possibilidades em pré e pós-campanha, esse conhecimento é essencial”, complementou.

Conforme Basílio, um dos diferenciais da internet é ser a única modalidade de propaganda que não é proibida três dias antes da eleição. “A internet é livre, para ela a regra de término de propaganda antes das eleições não vale. Então o candidato pode, mesmo no dia das eleições, fazer propaganda na internet, como, por exemplo, divulgar uma postagem no Facebook, enviar uma mensagem por WhatsApp ou postar algo no Instagram, o que muitos consideram, inclusive, uma boca de urna digital.”

O especialista em Direito Eleitoral ressaltou que é vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet. “O principal problema é o patrocínio de postagens. O Facebook e o Google oferecem essa possibilidade. É possível pagar para que, quando alguém digite a palavra ‘candidato’ no sistema de busca do Google, apareça o nome daquele candidato em primeiro lugar na lista de resultados da pesquisa. Isso é proibido”, exemplificou. Outro problema relacionado à propaganda eleitoral na internet é o anonimato. “Muitas pessoas insistem em fazer propaganda em nome de outras de forma anônima, com viés negativo, na maioria das vezes”.

Apesar de permitida legalmente, a doação online mediante cartão de crédito e débito para a campanha eleitoral de outubro é operacionalmente inviável.  “A redução do tempo (de informação sobre doações para 72 horas) inviabiliza arrecadação pela Internet, não dá para tratar com as operadoras (de cartão de crédito) para que as informações cheguem a tempo”, informou a Servidora Denise Goulart Schlickmann, secretária de Controle Interno do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE/SC), durante o primeiro painel da tarde de sexta-feira (13).

Schlickmann explicou que o TRE/SC respondeu questionamento de empresa de consultoria que se preparava para gerenciar a arrecadação online de campanhas no estado. “Os candidatos e os partidos terão de informar à Justiça Eleitoral em até 72 horas todas as doações recebidas, que serão divulgadas na Internet para  publicidade”, assinalou. Ela acrescentou que a matéria já chegou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Conta corrente, contador e advogados obrigatórios

Nesta eleição os candidatos e partidos serão obrigados a abrir conta corrente. Apenas naqueles municípios que não possuem agência ou posto bancário a conta é dispensada. “Não é o caso de Santa Catarina, todos os municípios possuem agências ou postos”, justificou a secretária de Controle Interno do TRE/SC.

Também serão obrigatórias as contratações de advogado e contador. “O Contador e o Advogado entram no limite de gastos. Se o Advogado não atua, se não há incidente na campanha e somente atua para postular as contas depois da campanha, então o gasto é pessoal do candidato”, ponderou, acrescentando que as despesas com custos judiciais não poderão ser pagas com recursos da campanha.

Dinheiro vivo

As doações em dinheiro vivo estão limitadas a R$ 1.064,10. “A partir deste valor as doações só podem acontecer de conta para conta, sai da conta do doador e entra na conta do candidato, para que dinheiro não fique dando voltas, em teias e percorrer 200  empresas até chegar no destinatário final, é isso que se procura evitar aqui”, esclareceu Schlickmann, que revelou que o extrato das contas de campanha exibirão parte e contraparte. “Não é um extrato normal, mostra de onde veio o crédito e para onde foi o débito”.

Ela explicou que na eleição municipal a Justiça Eleitoral terá condições de aferir se o doador tem capacidade econômica. Além disso, a base de dados dos candidatos será integrada ao sistema do Conselho de Controle de Atividades Financeira (COAF). “Convencemos o COAF a monitorar 700 mil pessoas – candidatos, partidos, dirigentes e administradores financeiros – a Justiça será informada automaticamente de qualquer movimentação suspeita. Na hora o Juiz Eleitoral acessa a informação”, informou Schlickmann.

A secretária de Controle Interno também revelou que a integração com a Receita Federal será em tempo real. “Tem um canal aberto e direto. As contas entram e ficam cruzando o tempo inteiro com os dados da Receita, um indício e retorna imediatamente para nós. Se é um CPF de um doador que morreu ou fornecimento de empresa baixada apura automaticamente”.

Não podem contribuir

Para a eleição municipal deste ano estão vedadas as doações de pessoas jurídicas (empresas), de origem estrangeira e pessoa física que exerça atividade comercial decorrente de concessão ou permissão pública (taxista, por exemplo).

O Advogado Pierre Vanderlinde questionou o fim da doação de pessoas jurídicas. “Será que a lei vai resolver isso ou vai aumentar o caixa dois? Se a empresa comete ilicitude para doar de maneira lícita, por que não fazer a ilicitude e doar de forma ilícita também?”, perguntou Vanderlinde, que destacou que a compra de votos acontece com dinheiro vivo. “Poderá ser dinheiro de caixa dois”, especulou.

Fotos: Agência AL

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *