Magistrados catarinenses manifestam opinião sobre a proposta de redução da maioridade penal

A Câmara dos Deputados retomou, no início deste ano, o debate sobre a redução da maioridade penal, prevista na proposta de Emenda Constitucional (PEC) n. 171/93. O assunto é polêmico e divide a Classe, como demonstrou recente consulta às Coordenadorias Regionais da Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC).

Em atenção à sua relevância, trazemos a visão de alguns Juízes sobre o assunto. Cada um dos sete entrevistados respondeu a três perguntas, as quais têm como objetivo identificar o posicionamento do Magistrado em relação à proposição; se considera que a proposta, caso aprovada, irá contribuir para a diminuição da criminalidade e da violência no País; e, por fim, o que é preciso fazer para reduzir o número de ilícitos praticados por adolescentes.

Ao final da matéria – logo após o texto que resgata a trajetória da PEC na Câmara dos Deputados, a atuação da Comissão Especial criada para analisar a proposta e a experiência em outros países do mundo -, a AMC publica a íntegra das entrevistas com os Juízes catarinenses.

A trajetória da PEC na Câmara dos Deputados

A discussão sobre a proposta de redução da maioridade penal é antiga: teve início em agosto de 1993 e ficou mais de 21 anos parada. O projeto original é de autoria do ex-Deputado Federal Benedito Domingos (PP-DF).  O texto altera a redação do artigo 228 da Constituição Federal, com o objetivo de reduzir de 18 para 16 anos a idade mínima para a responsabilização penal.

Pelo artigo 228 da Constituição, são "penalmente inimputáveis" os menores de 18 anos, "sujeitos às normas da legislação especial". A redação proposta pela PEC sugere que o artigo seja substituído por: “São penalmente inimputáveis os menores de 16 anos, sujeitos às normas da legislação especial”.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, que regulamentou a responsabilidade penal de menores de 18 anos, determina que os adolescentes de 12 a 17 anos podem responder por atos infracionais, como crimes e contravenções. Mas neste caso, aplicam-se medidas socioeducativas, que podem ir de advertência à internação por até três anos para os crimes mais graves, como o homicídio.

Neste ano, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara voltou a discutir o assunto e decidiu, em sessão realizada no dia 31 de março, por 42 votos a favor e 17 contra, pela constitucionalidade da matéria. Deputados contrários à mudança argumentam que a proposta fere cláusula pétrea da Constituição, o que a tornaria inconstitucional. No parecer vencedor, o Deputado Marcos Rogério (PDT-RO) afirmou que a redução da maioridade penal será debatida e todos terão tempo para argumentar contra ou a favor da proposta. Para ele, o Congresso pode, sim, legislar sobre o tema. "O artigo 60 parágrafo 4º da Constituição Federal proíbe Proposta de Emenda à Constituição tendente a abolir direitos e garantias individuais. A proposta que está aqui não é uma proposta que visa a abolir direitos e garantias. A proposta visa modificar."

A Comissão Especial

Poucos dias depois de passar pela CCJ, a Câmara dos Deputados instalou, no dia 8 de abril, a Comissão Especial que irá analisar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reduz de 18 para 16 anos a maioridade penal no país.

Foi escolhido como presidente do colegiado o Deputado André Moura (PSC-CE), e como vice, o Deputado Efraim Filho (DEM-PB). A Comissão designou o Deputado Laerte Bessa (PR-DF) como relator da matéria. Em seu primeiro discurso, Bessa reafirmou ser favorável à redução da maioridade, mas disse que seu posicionamento não influenciará na elaboração do relatório final da Comissão.

Um levantamento feito pela Agência Câmara aponta que 77,8% dos Deputados titulares da Comissão são a favor de que um adolescente a partir dos 16 anos seja responsabilizado penalmente como um adulto. Os outros 22,2% são contrários à mudança na legislação atual. O colegiado é formado por 27 integrantes titulares e igual número de suplentes.

Segundo o levantamento, entre os Deputados que concordam com a redução da maioridade, 52% defendem a elevação apenas para crimes hediondos, como latrocínio — que é o roubo seguido de morte, estupro e sequestro.

Além disso, 63% dos membros da Comissão concordam com a idade de 16 anos para que um jovem responda pelo crime como adulto. Três Deputados ouvidos defendem que não haja idade-limite, cabendo ao Juiz definir se o adolescente irá responder ou não como adulto. E um propõe a idade de 10 anos.

Se aprovada na Comissão Especial, a proposta será submetida ao plenário, onde são exigidos, no mínimo, 308 votos, do total de 513 deputados, para que o texto seja aprovado. São necessárias duas votações.

Se avalizado pela Câmara, o texto será encaminhado para apreciação da CCJ do Senado e mais duas votações no plenário. Para ser aprovado, ao menos 49 votos dos 81 senadores terão de votar a favor. Se a PEC for modificada, terá de retornar para análise dos Deputados Federais.

A maioridade penal no mundo

Matéria publicada recentemente no site da agência de notícias alemã Deutsche Welle informa que dos 54 países analisados pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância e Adolescência (UNICEF), 78% fixam a maioridade penal em 18 anos ou mais. Entre eles, estão o Brasil, Argentina, França, Espanha, China, Suíça e Uruguai.

Na Alemanha, onde a responsabilidade penal juvenil começa aos 14 anos, as prisões são a última opção para jovens infratores. O país dá prioridade a medidas disciplinares que envolvam o diálogo, exortação, pedido de desculpas, conciliação entre agressor e vítima, prestação de serviços e, em casos raros, pagamento de multas. A maioria dos processos é encerrada com essas medidas.

Já nos Estados Unidos, segundo o site alemão, o encarceramento de crianças e adolescentes não reduziu os índices de violência, e alguns Estados, como Texas e Nova York, já estudam elevar novamente a idade mínima. Em alguns Estados americanos, adolescentes são julgados como adultos e podem ser condenados à morte. Em 14 Estados, não existe idade mínima para que uma criança seja presa. Segundo a ONG Iniciativa pela Justiça Igualitária (EJI, na sigla em inglês), cerca de 10 mil crianças e adolescentes são levados às prisões dos EUA todos os dias.

No Brasil, pesquisas mostram que a maioria dos entrevistados é a favor da redução da maioridade penal. O UNICEF, por sua vez, se posicionou contrariamente à redução da maioridade penal. Segundo a agência da ONU, apenas 0,013% dos 21 milhões de adolescentes brasileiros cometeram atos contra a vida, como homicídio ou latrocínio. Ao mesmo tempo, afirma que os jovens são, na verdade, vítimas, dado o alto número de homicídios envolvendo pessoas desta faixa etária, e que o país não consegue garantir os mínimos direitos constitucionais às crianças, adolescentes e suas famílias.

O debate prosseguirá na Câmara dos Deputados. O Governo Federal, por sua vez, mostra-se contrário à proposta e, se ela for aprovada, a questão deverá ser discutida no Supremo Tribunal Federal (STF). (Com informações dos sites da Câmara dos Deputados e Deutsche Welle).

Clique aqui para ver a tramitação da PEC 171/93 na Câmara dos Deputados. (http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=14493)

 

Entrevistas

 

Juiz Geomir Roland Paul

1 – O sr. é a favor ou contra a redução da maioridade penal? Por quê?

Sou contra a redução da maioridade penal porque acredito não seja a solução para a redução da criminalidade no Brasil. Nossa legislação menorista é muito boa, tanto que foi “copiada”, na época, por países de primeiro mundo. Nossa legislação responsabiliza criminalmente o adolescente a partir dos 12 anos e esse fato não é divulgado e esclarecido à população. Se for para dar uma resposta ao crime praticado, sob o aspecto “castigo”, seria suficiente aumentar  o período em que o menor possa permaecer internado. Entretanto, o investimento na ressocialização é a meta a ser alcançada, pois em algum momento o adolescente será posto em liberdade e devolvido ao meio social. 

2 – O sr. considera que a proposta de redução da maioridade penal, caso seja aprovada, vai contribuir para a diminuição da criminalidade e da violência no país?

A redução da maioridade penal não contribuirá para a redução da violência e criminalidade em nosso país.

3 – O que é preciso fazer para reduzir a prática de ilícitos por adolescentes?

Para reduzir a violência e criminalidade é necessário investir em educação, garantir aos jovens a possibilidade de acesso a uma vida digna e honesta, em com certeza não será através desta equipe de governo que administra o país. O legado a ser deixado pelo atual governo é justamente o de que o crime vale a pena e compensa; o roubo, a malandragem, a mentira, a preguiça, são os adjetivos cultivados diariamente.

 

Juíza Brigitte Remor de Souza May

1 – A sra. é a favor ou contra a redução da maioridade penal? Por quê?

Contra.  A sensação que tenho é que ela (maioridade penal) se transformou num factoide, ou seja, "afirmação improvável, que de tanto ser repetida acaba sendo aceita como verdade inquestionável". Ainda mais num Congresso, que segundo todos dados e análises, é um dos mais "conservadores" em questões sociais (mas  liberal na economia…) desde a década de 80 (desde a redemocratização) e com o crescimento da "bancada da bala", formada por parlamentares ligados às forças de repressão". Em relação à prática de crimes, os adolescentes (entre 12 e 18) respondem por apenas 1% do que ocorre no País. 

2 – A sra. considera que a proposta de redução da maioridade penal, caso seja aprovada, vai contribuir para a diminuição da criminalidade e da violência no país?

Não. Conforme se extrai da nota da Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude (CEIJ):

1) Trata-se de matéria INCONSTITUCIONAL, porque: (a) ofende dispositivo imutável da própria Constituição Brasileira; e (b) viola a Convenção sobre Direitos da Criança das Nações Unidas, assinada pelo Brasil.

2) É DESNECESSÁRIA, pois o sistema jurídico brasileiro já responsabiliza o adolescente, em situações de conflito com a lei, a partir dos 12 anos de idade, prevendo medidas socioeducativas, mas que podem até mesmo implicar na privação de liberdade do autor de ato infracional.

3) É estatisticamente IRRELEVANTE, pois o número de atos infracionais cometidos por pessoas abaixo de 18 anos é muito menor do que a quantidade de crimes ou contravenções de autoria de adultos.

4) É INÚTIL, em razão: (a) da baixa eficiência do Estado em desvendar a autoria da maior parte dos delitos, levando à quase certeza da impunidade; (b) de estar comprovado que o aumento do rigor das leis penais não diminui a criminalidade (como, por exemplo, no caso da Lei dos Crimes Hediondos); (c) e conforme verificado na experiência de outros países.

5) É CONTRAPRODUCENTE, pois o encarceramento de adolescentes os levará ao sistema prisional brasileiro, que é o centro de comando do crime organizado. Como resultado desse convívio, teremos uma juventude muito mais violenta nas ruas.

3 – O que é preciso fazer para reduzir a prática de ilícitos por adolescentes?

Na verdade, seria importante trabalhar a violência de uma forma geral, pois crianças e  adolescentes são um reflexo do meio em que vivem  Da nota da CEIJ extrai-se ainda: "a necessidade do efetivo e integral cumprimento da Constituição e de todas as leis em vigor, inclusive do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o que ainda não ocorre, para que se implementem os direitos relativos à convivência familiar e comunitária, à promoção da saúde (inclusive o adequado tratamento para dependentes químicos, de todas as idades), à educação (desde a pré-escola, até a profissionalização, mais  cultura, esporte e lazer), ao trabalho e à segurança pública (com o indispensável incremento material e humano de todos os órgãos e instituições envolvidos). Repudiamos, por último, quaisquer desvios de conduta que importam no irremediável prejuízo dos investimentos necessários à consecução dos objetivos fundamentais da República.

A jornalista Eliane Brum faz uma reflexão interessante sobre a matéria:

"A redução da maioridade penal como medida para diminuir a impunidade e aumentar a segurança é uma fantasia fabricada para encobrir a verdadeira violência. Segundo o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), dos 21 milhões de adolescentes brasileiros, apenas 0,013% cometeu atos contra a vida. Mas são eles que estão sendo assassinados sistematicamente: o Brasil é o segundo País no mundo em número absoluto de homicídios de adolescentes, atrás apenas da Nigéria. Hoje, os homicídios já representam 36,5% das causas de morte por fatores externos de adolescentes no País, enquanto para a população total corresponde a 4,8%. Mais de 33 mil brasileiros de 12 a 18 anos foram assassinados entre 2006 e 2012. Se as condições atuais prevalecerem, afirma o Unicef, até 2019 outros 42 mil serão assassinados no Brasil".

 

Juiz Fernando de Castro Faria

1 – O sr. é a favor ou contra a redução da maioridade penal? Por quê?

Contra, porque não irá resolver o problema da segurança. Se o país não virasse as costas para a Infância e a Juventude, como faz hoje, não se falaria em redução da maioridade penal. Bem sabemos como são as nossas prisões, a luta diária pela sobrevivência lá dentro. Uma vez preso, o nosso jovem será facilmente cooptado a praticar outros delitos quando sair, até porque terá “dívidas” com os líderes do local para garantir sua integridade no interior das celas, conforme ressaltou recentemente o Dr. Dráuzio Varella, que conhece a realidade prisional muito bem.

São várias as razões pelas quais sou contra. Uma outra é a falsa ideia de que adolescente não é punido no Brasil. Ora, o argumento é falso, pois adolescentes podem ser responsabilizados a partir dos 12 anos. Portanto, quando se fala que em outros países a idade penal é de 10, 12, 14 ou 16, temos que ser honestos e reconhecer que no Brasil começa aos 12. A forma como se processa e o local para onde irão os infratores é que é diferente, e nisso não há nada de errado, posto que não se nega a condição peculiar de desenvolvimento deles nessa faixa etária. Não me convence o argumento de que os presos com 16 e 17 anos deverão ficar em local distinto dos demais, porque não cumprimos a Lei de Execuções Penais já existente. Seria mais um dispositivo para não ser cumprido, assim como o ECA não é cumprido integralmente.

2 – O sr. considera que a proposta de redução da maioridade penal, caso seja aprovada, vai contribuir para a diminuição da criminalidade e da violência no país?

Não, em hipótese alguma. Mudanças sociais e culturais não decorrem de textos legais. É ilusão. Temos como exemplos a edição da lei dos crimes hediondos e a guerra às drogas. Reduziu a criminalidade? Não, obviamente.

3 – O que é preciso fazer para reduzir a prática de ilícitos por adolescentes?

Cumprir o artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), que fala que é dever de todos (família, sociedade e Estado), cuidar das crianças e dos adolescentes com “absoluta prioridade”, termo este que a Constituição utilizou uma única vez. A redução da violência e a criminalidade passa também pela redução da desigualdade social, pela ampliação do leque de oportunidades aos jovens e de políticas públicas, principalmente nas áreas de maior vulnerabilidade social. Outra questão importante, que não debatemos por se tratar de um verdadeiro tabu, é a da legalização, com controle pelo Estado, de algumas drogas. As experiências têm sido positivas em vários países. O próprio (ex-presidente) Fernando Henrique Cardoso fez um documentário relatando tais avanços, chamado “Quebrando o Tabu”. Se não há como evitar o comércio ilegal de drogas (e a experiência mostra que não conseguimos), temos que optar por uma política de redução de danos. A guerra só gera lucro às indústrias bélicas e de segurança privada, com algum dividendo eleitoral aos que exploram o punitivismo. No mais, todos perdem.

 

Juiz Márcio Umberto Bragaglia

A favor de uma drástica redução da menoridade penal

Não apenas como cidadão, mas também como juiz criminal de perfil conservador, sou completamente a favor da redução da menoridade penal, não apenas para os modestos 16 anos propostos, mas para  um sistema que, a partir de 12 anos, permita ao juiz avaliar a gravidade do caso concreto e grau de consciência envolvido, e decidir sobre a aplicação de penas severas compatíveis, se for o caso.  Em significativa parcela do mundo civilizado a idade penal é ainda menor, e também dependente da natureza dos delitos.

O argumento de que a redução da menoridade não terá efeitos na redução da criminalidade é inválido por uma série de razões. Trata-se de mais uma das falácias dessa corja esquerdista que tomou o país de assalto e que contaminou a comunidade jurídica com idéias de proteção a criminosos sob pretexto de defesa e direitos humanos. O povo brasileiro, de quem “todo poder emana” segundo a vontade constitucional, é 87% a favor de uma drástica redução da menoridade (cf. Datafolha, dias atrás), pois está cansado de ver pessoas inocentes serem abatidas feito moscas por delinqüentes protegidos por essa vergonha jurídica denominada Estatuto da Criança e do Adolescente.

As pessoas normais, aquelas que vivem no mundo real e não nas universidades, academias e redações de jornais (ambientes estes completamente dominados pela doutrinação ideológica marxista e pela engenharia do comportamento, de viés gramsciano), há muito perceberam que não é possível tolerar as quase 70 mil mortes anuais causadas pelo crime no Brasil sem uma resposta punitiva e preventiva mais dura.

E não se trata de suspirar por hipotéticos efeitos simbólicos do direito penal, de prevenção geral, ou seja, de imaginar que existência de responsabilidade penal irá prevenir, por intimidação, que menores cometam os homicídios, latrocínios, estupros e tráficos a que estão habituados.  Trata-se apenas de garantir que esse ou aquele menor criminoso específico não volte a delinqüir, porque estará contido em um sistema prisional real, não nesses parquinhos de diversão que são os centros de internação de menores, nos quais só não foge quem não quer, onde grades e algemas são vedadas e onde os verdadeiros prisioneiros são os agentes. O velho bardo, em Macbeth,  já nos ensinava que  quem se comporta como um animal descontrolado deve como um animal ser imediatamente contido, sob pena de a bola de neve que é o comportamento  criminoso violento ir aumentando, com o aumento das vítimas inocentes e do sofrimento das famílias.  Tentativa de ressocialização do criminoso juvenil sim, mas primeiro segurança à sociedade, abalada em concreto pela liberdade precoce daquele indivíduo específico.

O tipo de prevenção que a urgente redução da menoridade penal pode gerar contra a prática de crimes por esses assassinos e criminosos juvenis que os sociólogos de plantão denominam seres em formação (de rabos e chifres?) é a prevenção específica, ou seja, aquela garantia de que o menor infrator, após praticar um gravíssimo crime, ao ser efetivamente preso, processado e, havendo provas suficientes, condenado, não irá ele mesmo voltar a estuprar, roubar e matar nossas crianças, os pais de família, o povo trabalhador, ao menos não tão cedo. Se a prisão de um menor infrator prevenir um desses crimes que ele muito provavelmente voltaria a cometer, incentivado pelo atual sistema de impunidade, e vier a salvar uma única vida, isso já bastaria para justificar a redução, pois, como diz o Talmude, “quem salva uma vida é como se salvasse o mundo inteiro”.

Com a redução da menoridade penal será sim o delinqüente afastado por longos períodos de tempo do seio social, em um sistema que, se por um lado deixa a desejar em termos de ressocialização, por outro não deixa de ser um ótimo meio de proteger as pessoas honestas e trabalhadoras, de todas as classes sociais, por retirar de circulação, pelo encarceramento, perigosos delinqüentes.

Outra questão: redução de menoridade não tem, necessariamente, que ser discutida do ponto de vista de redução da criminalidade. Por que não apreciar a questão do ângulo de aplicar a Justiça, que é o principal objetivo do Direito? É justo que um marginal de 15, 16 ou 17 anos entre na casa de uma família, estupre e mate, e ao final de um processo judicial seja meramente “condenado” a uma rápida estadia num desses centros de internação de menores, podendo (e infelizmente é essa a regra) ser solto em pouco mais de 6 meses de internação, para voltar a estuprar, traficar e matar? Direito penal não é só ressocialização, é e deve ser também ser Justiça por retribuição e por punição, para proteção das pessoas de bem contra perigosos indivíduos específicos, não importa de qual idade, porque na hora de matar eles pouco ligam para o fato da vítima ter ou não menos de 18 anos. O resto é blablablá de juristas, tão bonito em tese de doutorado quanto ineficiente no mundo real.

Finalmente, faço questão de citar Olavo de Carvalho, que com a lucidez de sempre espanca mais um dos argumentos, aquele de que cadeia é “escola do crime”: “O moleque armado entra na sua casa, mata sua esposa, seu filho ou você mesmo, e depois não se pode enviá-lo à cadeia porque lá – dizem os sapientíssimos – ele vai aprender a cometer crimes. Como se já não soubesse cometer o pior deles.”

 

 

Juiz Alexandre Karazawa Takaschima

1 – O sr. é a favor ou contra a redução da maioridade penal? Por quê?

Sou contra a redução da maioridade penal, principalmente porquanto não demonstrado qual seria o principal objetivo dessa mudança legislativa. Se o motivo é a redução da violência no país, precisamos analisar efetivamente quais seriam os motivos que a originam e, aí sim, traçar as estratégias e as ações necessárias para atingirmos tal objetivo. Recentemente, em 12 de janeiro de 2012, foi publicada a Lei n. 12.594, que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), cuja implementação ainda está ocorrendo em nosso Estado, demonstrando que a discussão, neste momento, me parece precipitada, haja vista todo o reordenamento envolvendo a responsabilidade do Poder Executivo Estadual na aplicação das medidas socioeducativas de privação de liberdade (internação e semiliberdade) e do Poder Executivo Municipal das medidas socioeducativas em meio aberto (prestação de serviço à comunidade e liberdade assistida). Nosso Estado está começando a concluir as primeiras obras (estruturas físicas) de acordo com a nova Lei do SINASE (Centro de Internação da Região Metropolitana da Capital e de Joinville). Importante destacar que o Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo foi lançado tão somente em Novembro de 2013, não estando concluído, ainda, o Plano Estadual de Atendimento Socioeducativo. Enfim, sequer houve tempo para implementação da lei sancionada em 2012 e já se está pensando novamente em outra alteração legislativa.

2 – O sr. considera que a proposta de redução da maioridade penal, caso seja aprovada, vai contribuir para a diminuição da criminalidade e da violência no país?

Analisando as estatísticas da Secretaria de Estado da Segurança Pública de Santa Catarina, no último trimestre de 2014 foram presos em nosso Estado (flagrante e mandado de prisão) 6.839 adultos, enquanto que no mesmo período foram apreendidos (flagrante e mandados de busca) 366 adolescentes. Assim, observa-se que os atos infracionais são enormemente inferiores ao número de delitos praticados pelos adultos, não subsistindo o argumento de que a redução da maioridade penal, por si só, seja a grande solução para os problemas da criminalidade e da violência. Um grande exemplo de que não basta apenas a mudança legislativa é a lei dos crimes hediondos, que não conseguiu diminuir o número dos referidos crimes. Por outro lado, temos uma superlotação das unidades prisionais em SC, sendo desumano a inclusão de mais esses jovens nesse sistema que não possui espaço adequado sequer para a população adulta.

3 – O que é preciso fazer para reduzir a prática de ilícitos por adolescentes?

O debate sobre a questão da violência em nosso Estado é importante e urgente. De nada adianta o sistema de justiça aplicar medidas socioeducativas sem a garantia de sua execução (por exemplo, falta de vagas de internação) e eficiência. Mas os investimentos não devem ser canalizados apenas para o ato infracional. Mais do que punição, devemos pensar sempre na prevenção e responsabilização, dentro do contexto da comunidade. Precisamos conjugar ações com todos os atores da rede da infância e juventude (proteção e socioeducação). Uma boa prática realizada nesta Capital é o "Projeto Procurando Caminho", do Centro Cultural Escrava Anastácia, que ao custo aproximado de meio salário mínimo retira o adolescente envolvido com o tráfico, através de esportes radicais, educação e profissionalização. Outra boa prática está ocorrendo no Sul do Estado, na comarca de Sombrio, através do projeto "Oficina Profissionalizante", em que os adolescentes em conflito com a lei estão sendo capacitados através de cursos e inseridos no mercado de trabalho, numa parceria entre o Poder Judiciário, Ministério Público, Poderes Executivo e Legislativo municipais (municípios de Sombrio e Balneário Gaivota) e empresariado. Há o "Projeto Vida Nova", na Comarca de São Miguel do Oeste, que através de articulação da rede local está atuando no bairro com maior vulnerabilidade, reduzindo em aproximadamente 40% o número de atos infracionais daquele bairro em um ano de atividade. Como se vê, há muito o que se fazer e pensar sobre a questão da violência. Porém, salvo melhor juízo, não seria tão somente a modificação da idade da imputabilidade penal que faria uma grande mudança do atual cenário dos atos infracionais em nosso país.

 

Juiz Ederson Tortelli

1 – O sr. é a favor ou contra a redução da maioridade penal? Por quê?

A favor. A juventude merece mais respeito do Poder Público. E esse respeito significa considerar o adolescente uma pessoa capaz de assumir a responsabilidade por seus atos. É uma tolice, um contrassenso, um atentado à boa educação, o Estado tratar o adolescente como um sujeito dotado de superdireitos e, ao mesmo tempo, tratá-lo como um objeto a ser moldado, como uma coisa portadora de disformidades intelectuais, incapaz de saber que é errado matar um pai de família, estuprar uma mulher ou mesmo furtar uma escola. Isso não é tratar o jovem com respeito. Pelo contrário, é menosprezá-lo e reduzi-lo à condição de inferioridade.

2 – O sr. considera que a proposta de redução da maioridade penal, caso seja aprovada, vai contribuir para a diminuição da criminalidade e da violência no país?

Essa questão não é importante. Pouco importa saber isso. As causas do crime vão muito além de conceitos abstratos de imputabilidade penal. Aliás, num primeiro momento, a redução da maioridade penal, por certo, vai aumentar o número de crimes, porque uma série de condutas dos menores, antes impuníveis, passaria a ser reprimida de acordo com o Direito Penal. E esse aumento das estatísticas, por mais absurdo que seja, na verdade, é salutar para a pacificação social.

3 – O que é preciso fazer para reduzir a prática de ilícitos por adolescentes?

Abstraindo os "achismos" teóricos que sempre dominam esse tipo de discussão, na prática, o problema da criminalidade demanda duas soluções há muito tempo conhecidas, porém, esquecidas pelo Poder Público e pela massa dita intelectual. A primeira é não criar a oportunidade para que o crime aconteça. A segunda é assegurar a certeza da punição aos infratores da Lei. Passamos em velocidade compatível por uma lombada eletrônica, não por beneplácito cívico ou moral, mas porque temos certeza que seremos enquadrados e punidos por eventual velocidade excessiva. Não há segredo. É muito simples. E por mais surreal que seja, no Brasil, há um faz de conta nesses particulares, por exemplo, pela total falta de incentivo, ou mesmo pela excessiva recriminação ao trabalho dos jovens como forma de educação e de afastamento do crime e pela certeza da impunidade dos delitos praticados por menores de idade. Aliás, tudo é uma fábula neste país, menos para as vítimas, que, independentemente da idade do infrator, sofrem desde logo o imperativo das consequências do crime, sem qualquer medida socioeducativa para lhes consolar e sem qualquer atenuante da dura realidade, muita vez trágica e fatal.

 

Juiz Jeferson Osvaldo Vieira

1 – O sr. é a favor ou contra a redução da maioridade penal? Por quê?

Sou favorável à proposta de redução para 16 anos. O parâmetro para a definição da imputabilidade penal é a capacidade do agente para compreender o caráter ilícito de suas condutas e de se comportar de acordo com esse entendimento. Na sociedade atual ninguém pode negar que um indivíduo com mais de 16 anos tem essa condição. O descompasso da legislação atual com a realidade permite que muitos crimes graves fiquem impunes e deixa as pessoas que respeitam o ordenamento jurídico à mercê de ações violentas daqueles que, conscientes de que não serão punidos, investem cada vez mais na senda do crime. Ao mesmo tempo, deixa o sistema estatal de mãos atadas, sem meios eficazes para conter as investidas criminosas. Com o devido respeito a quem pensa diferentemente, as medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que fossem aplicadas a contento, não seriam suficientes para desestimular as ações delituosas de uma parcela significativa dos maiores de 16 anos.

Sobretudo, as pesquisas de opinião demonstram que a ampla maioria da sociedade é favorável à redução e cabe ao Congresso Nacional, no exercício da representação popular, fazer valer a vontade soberana que o legitima. É uma decisão de caráter político e nela não vemos qualquer inconstitucionalidade. Não cabe a determinados setores se arvorar na condição de decidir a respeito, a pretexto de que a sociedade não tem a maturidade ou compreensão técnica para fazê-lo, pois isso seria essencialmente antidemocrático.

2 – O sr. considera que a proposta de redução da maioridade penal, caso seja aprovada, vai contribuir para a diminuição da criminalidade e da violência no país?

É difícil fazer esse prognóstico porque os níveis de criminalidade decorrem de diversos fatores. Diuturnamente surgem novas oportunidades ilícitas que proporcionam ganho fácil e o acesso a armas e drogas vindos do exterior não é combatido com eficácia, o que contribui muito para o aumento.

No entanto, a decisão sobre a redução da idade penal não deve ser orientada por esse viés, ou pelo contraponto sempre apresentado, de que o sistema carcerário brasileiro não recupera o apenado. É fato que nosso sistema prisional não cumpre a função ressocializadora da pena, mas isso deve ser enfrentado com a adequação das unidades prisionais às normas legais e aos tratados sobre direitos humanos, e não mediante abolição da pena de prisão ou mecanismos para evitar sua imposição.

E ainda que a redução da maioridade penal não gere, em termos estatísticos, a diminuição da criminalidade, ao menos vai ensejar meios para fazer cessar as ações violentas de muitos que, soltos e impunes, estão praticando crimes graves, o que já é um ganho considerável à sociedade.

3 – O que é preciso fazer para reduzir a prática de ilícitos por adolescentes?

É certo que só faz a aumentar a parcela de adolescentes que, na faixa dos 12 ou 13 anos, ingressam nas atividades criminosas, inicialmente em pequenos delitos e depois evoluem para ações violentas. É fundamental proporcionar acesso à educação e oportunidades sociais a eles, e combater o crime organizado, principalmente aquele voltado ao tráfico de entorpecentes, que costuma cooptá-los para ações ilícitas. Ademais, criar a estrutura necessária para que os ditames previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente sejam efetivamente implementados.

 

 

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