As mudanças trazidas pelo novo Código de Processo Civil (CPC) deverão reduzir o tempo de tramitação dos processos na Justiça brasileira. Esta é a opinião do advogado Luiz Gustavo Lovato, um dos três professores do curso de Atualização sobre o novo CPC, que será promovido pela Escola Superior da Magistratura do Estado de Santa Catarina (ESMESC), nas cidades de Florianópolis, Blumenau e Chapecó. O curso tem como objetivo oferecer aperfeiçoamento na sistemática proposta com a implementação do novo diploma processual e é direcionado para a formação e aprimoramento da comunidade jurídica.
Na entrevista que segue abaixo, o advogado e professor fala sobre as principais mudanças trazidas pelo novo código e de que forma ele vai influenciar no dia a dia daqueles que operam o Direito. Lovato é mestre em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS), professor de curso de graduação e pós-graduação em Direito e membro da Comissão Temporária para Estudo do Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil da OAB/SC. Todas as informações sobre o curso podem ser obtidas no site da ESMESC (WWW.esmesc.org.br).
Confira a entrevista:
1 – Quais as principais alterações trazidas pelo novo Código de Processo Civil?
O Novo Código de Processo Civil trouxe inúmeras alterações. Pode-se dizer que a principal delas foi criar um rito comum único, extinguindo os ritos ordinário e sumário. Nesse rito, a estabilidade subjetiva da demanda, que impedia o acréscimo de pessoas nos polos da demanda após a propositura consoante a livre vontade das partes, também foi relativizada. Pode-se inserir pessoas através da reconvenção, por exemplo, que não figuravam na inicial. Em relação às execuções, houve a absorção pelo texto legal da maioria das Súmulas das cortes superiores acerca da matéria. Também é importante salientar que o juízo de admissibilidade da maioria dos recursos passou a ser de competência do juízo ad quem, e não mais o a quo. Evidentemente, existem inúmeras outras alterações relevantes, mas essas são as que saltam aos olhos do jurista em uma primeira leitura.
2 – Na sua opinião, em geral, as mudanças promovidas no nosso CPC foram positivas? Quais os principais avanços?
As mudanças foram positivas, no geral. Entre os principais avanços, a meu ver, estão a própria reestruturação do processo e a possibilidade de se cumular diversas ações aproveitando os mesmos autos. Antes, muitas vezes era necessário propor novas ações em autos apartados para conseguir uma efetividade da tutela principal. Agora, tudo é feito em um único instrumento. Isso facilita a agilidade do feito. Os recursos passaram a ser dispendiosos, o que fará a parte pensar muito antes de interpor um recurso protelatório ou que seja uma aventura judicial. Recorrerá (ou mesmo proporá demanda judicial) quem tiver um certo juízo de certeza acerca da sua pretensão. Isso deve ser somado à busca pela unicidade da jurisdição com os efeitos vinculantes e vinculativos das decisões das cortes superiores. Mudanças que farão os brasileiros repensarem a judicialização dos seus problemas. Mais do que nunca, um bom acordo será, na maioria das vezes, a melhor solução.
3 – O novo CPC vai garantir mais agilidade à tramitação dos processos na Justiça?
Penso que a agilidade de tramitação não é um problema da lei processual. Temos, inicialmente, o problema estrutural do Poder Judiciário. Imagine uma vara da Capital de Santa Catarina que tenha oito mil processos. Isso não é raro. Se cada processo tivesse apenas uma página, ainda assim o gabinete (juiz e assessores) deveria realizar a leitura de oito mil páginas. Faltam varas e faltam juízes. Isso é estrutural. O outro problema é cultural (ou mesmo social). O brasileiro judicializa tudo. As formas alternativas de solução de conflitos, por mais que sejam eficientes e tenham leis bem elaboradas, são desacreditadas pela maioria da população, que na figura do juiz o baluarte para todas as soluções dos seus problemas. Muitas vezes as partes envolvidas no conflito desejam realizar o acordo, mas só o fazem perante o magistrado, pela via do processo. Se sentem mais seguras, quando isso não condiz com a realidade. A segurança jurídica existe na arbitragem, na autocomposição, no referendo do acordo pelo advogado, etc. Posso dizer que, não agilidade, mas redução do tempo do trâmite processual é algo que provavelmente acontecerá com o novo CPC.
4 – A Associação dos Magistrados Brasileiros tem fomentado o debate sobre o uso predatório da Justiça, em que empresas de telefonia, bancos e o próprio poder público se vale do excesso de recursos para postergar o cumprimento de suas obrigações. Em que medida o novo CPC pode contribuir para coibir este tipo de prática?
O novo CPC consolida uma prática que atualmente já existe: a aplicação dos acórdãos paradigmas, resolvidos em sede de incidente de demandas repetitivas ou recursos especial e extraordinário repetitivos. Isso impedirá que muitos processos ultrapassem o segundo grau. Também, as chamadas tutelas de evidência (que atualmente já possuem uma previsão parecida nos arts. 285-A e 285-B do CPC/73) ajudam a resolver o processo sem a necessidade de uma instrução probatória extensa. Como eu disse anteriormente: lei tem, o nosso problema é estrutural e, principalmente, cultural. São várias as previsões para coibir atos protelatórios: desde multas até a sucumbência por fase do processo. O problema é que, para algumas das entidades que utilizam o processo para protelar, a demora compensa a multa paga. Isso deve mudar e, a meu ver, mudará. Sou um otimista, mas é um fator que não depende exclusivamente do legislador. Todos os envolvidos no processo devem colaborar. Partes, terceiros, juízes, Ministério Público…
5 – O que ainda pode ser feito para termos uma Justiça mais ágil, com ritos processuais menos complexos?
Os ritos processuais não podem ser menos complexos do que já são. Porque existe uma série de princípios constitucionais, como o contraditório, a ampla defesa, a concentração dos atos processuais e o duplo grau de jurisdição (esse implícito) que impedem que se faça a celeridade através do corte de fases ou atos processuais. Um instituto que será de suma importância para a agilidade do processo é a sentença parcial de mérito. Poder transitar em julgado no curso da fase de conhecimento do processo é impedir que, após agravada, a sentença seja rediscutida em sede de apelação. O agravo de instrumento passará a ser o principal recurso do processo, o que é bom. As decisões vão transitando em julgado ao ponto de, na sentença definitiva que encerrar a fase de conhecimento, somente a matéria presente nessa é que será impugnável por apelação. Reduzirá a matéria discutível em sede de recurso. Isso criará mais elementos no curso do processo, mas, penso, agilizará o resultado final e definitivo da demanda.
6 – Qual o objetivo, como ele está estruturado e qual a importância do curso oferecido pela ESMESC sobre o novo CPC?
O curso oferecido pela ESMESC está totalmente estruturado conforme o novo CPC. Não será um estudo comparativo, do tipo "como é e como vai ficar". Isso demandaria muito tempo e causaria confusão entre alguns alunos. A ideia é fazer um curso que propicie o ensino através da análise sistemática do novo CPC, sem considerar os ritos e procedimentos do CPC/73. Como começar do zero. O conhecimento acerca do processo como está definido atualmente reside na mente do aluno, que poderá fazer a comparação por suas próprias experiências. É um estudo de desconstrução e reconstrução. Quem procura o curso quer se antecipar, e não esperar até março de 2016 para descobrir, somente então, que a mudança é mais drástica do que aparentava. O aluno que procura o curso trará perguntas e fará apontamentos, e isso será uma valorosa contribuição para todos. É um público já com experiência no estudo do processo. Vejo, em minhas aulas, que muitos alunos de graduação também querem procurar o curso; principalmente aqueles que já esgotaram todas as cadeiras de Processo Civil e se veem, agora, diante da probabilidade de realizar concursos que versem sobre o novo Códex. Como eu disse, o curso visa reconstruir o entendimento acerca do processo a partir de um alicerce totalmente novo, sem elementos comparativos. Esses elementos surgirão nas aulas através das contribuições dos alunos. O corpo docente é composto por profissionais com experiências diversas, e isso ajudará também. Eu, que sou advogado, ministrarei a Parte Geral; o Dr. Rudson, que é juiz de primeiro grau, ministrará procedimentos especiais e execuções; o Desembargador Saul ministrará recursos. Cada um com larga experiência não apenas acadêmica, mas também de atuação prática em sua área de ensino. Penso que será um sucesso. Não tem como não ser.