Nova Lei Seca reduz impunidade e aumenta processos na Justiça

 

Os magistrados catarinenses começam a enfrentar os desdobramentos da Nova Lei Seca, que entrou em vigor no final de 2012 e alterou aspectos da Lei n. 9.503 de 1997. A discussão se torna cada vez mais importante já que, nos cinco primeiros meses deste ano, o número de processos em trâmite na Justiça de Santa Catarina relacionados a crimes de trânsito já aumentou em 35%.

A quantidade de flagrantes e ações penais vem aumentando basicamente por dois motivos: o aumento da fiscalização, por parte da polícia, e pela aceitação de novas provas para comprovar a embriaguez, como relatos, fotos e vídeos.

Para a desembargadora Marli Mosimann Vargas há, por outro lado, uma redução na impunidade, já que a embriaguez agora pode ser comprovada por outras formas, além do bafômetro e exame de sangue.  A falta de provas suficientes é um desafio para a condenação dos culpados e leva muitas vezes à absolvição dos envolvidos.

A magistrada recorda que em 2006, o desembargador Irineu João da Silva já decidia com base no relato dos guardas de trânsito. O precedente foi aberto, pois o juiz entendia que os depoimentos demonstravam a capacidade do condutor, se estava visivelmente embriagado ou não.  As principais características encontradas são a aparência do condutor, sinais de sonolência, olhos vermelhos, odor de álcool, agressividade, alteração do senso de orientação e fala.

Ela não descarta a importância da prova pericial. “O bafômetro e exame de sangue não devem ser descartados, pois a prova testemunhal não é sempre garantida”, enfatiza. Em alguns casos a testemunha faleceu, mudou-se ou está impossibilitada de prestar depoimento.

Neste sentido, o juiz Eduardo Camargo, da Comarca de Chapecó, chama a atenção para que a norma penal não se resuma à interpretação literal ou gramatical, sem a mínima preocupação e cuidado com o espírito da lei, sob pena de engessar o bom senso do julgador e perpetuar injustiças. “Faz-se necessária a descrição de que o agente estava conduzindo o veículo automotor sob influência de álcool, indicando o fato exterior, ou seja, a conduta anormal. A qual já é suficiente para expor a risco a segurança viária, e não apenas que foi ultrapassado o limite legal de concentração, que constitiu tão somente infração administrativa”, explica.

Para o magistrado, todas as condutas proibidas por consistirem em risco à segurança da coletividade no trânsito só serão erigidas à categoria de infração penal se delas resultar risco concreto de dano, demonstrado por alguma ação do condutor.

O juiz Décio Menna Barreto de Araújo Filho, do Juizado Especial Criminal de Joinville, acredita que, agora, na prática, quase todos os motoristas, mesmos os embriagados, não vão se recusar a realizar o teste do bafômetro. “Isso tem uma razão prática: antes, a negativa levava à impunidade; agora, se houver negativa, estará sujeito ao testemunho dos policiais”, pontua. Para ele, então, vale mais a pena realizar o teste, com a esperança de ter menos de 0,60 mg/l.

O magistrado aponta para outra realidade: “o alcoolismo precisa ser tratado como questão de saúde pública da mais alta relevância, hoje muito mal enfrentada, de incidência muito maior do que se admite e que se imagina”, defende. No Brasil um estudo, realizado pelo Ministério da Saúde em hospitais públicos, revela que o consumo do álcool tem forte impacto nos atendimentos de urgência e emergência do Sistema Único de Saúde (SUS).  O alcoolismo está relacionado com 21% dos acidentes de trânsito.

Os dados fazem parte do VIVA (Vigilância de violências e acidentes), estudo feito pelo Ministério da Saúde em 71 hospitais que realizam atendimentos de urgência e emergência pelo SUS. Foram ouvidas 47 mil pessoas em todas as capitais e no Distrito Federal. Os dados foram coletados em 2011 e analisados no ano passado. Uma em cada cinco vítimas de trânsito atendidas em pronto-socorros públicos no país confirmou ter ingerido bebida alcoólica ou apresenta sinais de embriaguez.

Outra mudança relevante está na penalidade, definida pelo artigo 165.  As medidas administrativas estão mais severas, com a ampliação do valor da multa, que pode chegar a R$ 3.830,60, em caso de reincidência.  Além, é claro, do recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo. As penalidades judiciais são definidas de outra forma, com base no Código Penal.

A desembargadora Marli considera que a pena prevista para o homicídio culposo é muito pequena, já que são dois anos. Mas, ela também teme que com um aumento para oito anos, por exemplo, pessoas de bem, que não tem propriamente o perfil de criminoso, fique na cadeia em regime fechado. “Então, não sei bem a medida exata”, reconhece. Outras punições podem ser a prestação de serviço à comunidade ou o pagamento de indenização. “Com o princípio da irretroatividade penal, as alterações passam a valer para o futuro, geralmente a partir da data da publicação”, explica, recordando que a nova redação não pode ser aplicada aqueles casos que foram cometidos antes da legislação entrar em vigor. “A Nova Lei um avanço que, com o tempo, vamos considerar se é bom ou precisa melhorar. Na questão das provas, me parece, estar completa”, finaliza.

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