Especialista critica propostas apresentadas para reformar Código Penal brasileiro

 

A Escola Superior da Magistratura do Estado de Santa Catarina (Esmesc) e a Academia Judicial do Poder Judiciário de Santa Catarina iniciaram, na manhã desta quinta-feira (9/5), as atividades do seminário “A Reforma do Código Penal em debate”, no Auditório Solon d’Eça Neves, na Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC).

A abertura das atividades contou com a presença de um bom público, com a participação de magistrados, operadores do Direito e estudantes. Em seu discurso de boas vindas, o Diretor-geral da Esmesc, Juiz Cláudio Eduardo Régis de Figueiredo e Silva, agradeceu o empenho dos envolvidos na realização do evento e destacou a relevância do debate, cujo tema tem sido tão discutido pela sociedade nos dias atuais. “Esse tipo de discussão faz parte do nosso futuro, o futuro da nossa Nação. É aqui no foro acadêmico, na Escola, o lugar que podemos pensar juntos qual direito penal que queremos e qual será o seu rumo daqui para frente”, afirmou o magistrado.

Em seguida, o presidente da AMC, Juiz Sérgio Luiz Junkes, também aproveitou a oportunidade para ressaltar o protagonismo catarinense na promoção de um evento, que envolve temas de abrangência nacional. “É uma satisfação para nós da AMC realizar esse encontro, ainda mais num momento em que o cidadão espera respostas da Justiça, com o aumento da criminalidade. Fico muito feliz em saber que o Judiciário catarinense faz parte desse debate tão importante para a sociedade brasileira”, disse.

A abertura do primeiro painel, intitulado “A ideologia da reforma penal”, foi feita pelo advogado criminalista Juarez Cirino dos Santos, também professor da Universidade Federal do Paraná. Em uma hora de explanação, Juarez fez uma análise crítica do anteprojeto do Código Penal brasileiro, em tramitação no Congresso Nacional. Dividido em duas partes, uma geral e outra específica, o atual conjunto normativo comporta uma quantidade exacerbada de crimes, segundo o profissional, um dos fatores que motivou a iniciativa legislativa. No entanto, ele acredita que a redação do novo código está longe de cumprir a sua real função.

“A comissão perdeu a chance de uma grande reforma humanista, que apostasse na descriminalização. Temos mais de 2700 crimes diferentes. Essa aposta na pena como maneira de resolver conflitos sociais é uma forma perdida desde sempre. O estado continua apostando em polícia e na pena para resolver problemas, mas esquece das ações sociais e do investimento na melhoria das condições de vida das pessoas”, salientou.

O advogado também apresentou números alarmantes, acerca do crescimento prisional nas últimas duas décadas. A população carcerária pulou de 100 mil detentos (nos anos de 1990) para mais de 500 mil atualmente. Para Juarez, uma das principais causas desse número é o investimento na pena e a falta dele quanto às condições prisionais para uma recuperação efetiva. “Temos ciência de que quanto maior a pena, maior a reincidência. Todo mundo sabe que a maioria dos apenados sai mais perigosa do sistema prisional do que quando entrou”, explicou.

Aproveitou também para ressaltar os princípios de uma lei penal democrática (legalidade, culpabilidade, lesividade, proporcionalidade, humanidade), em sua opinião deixadas de lado pelo anteprojeto, por vários motivos – entre eles a simples redação, confusa e ambígua tanto para a sociedade quanto para os profissionais do Direito. “O texto sobre crimes cibernéticos têm tantos termos técnicos e confusos que é preciso fazer um curso de informática para decifrá-los”, gracejou Juarez.

Antes de encerrar o primeiro painel dos três dias de atividades, o professor ainda fez uma análise sociológica desde a idade média até os tempos atuais, como forma de avaliar as diferenças sociais impostas pelo sistema do capital financeiro, segundo ele, um dos ditadores da realidade em que vivemos. Por fim, Juarez lamentou a falta de diálogo no planejamento do anteprojeto, bem como a exclusão de métodos alternativos de cumprimento de pena, já consolidados no Brasil.

“A redação do novo código suprimiu o projeto da condicional. Uma experiência com sucesso no mundo todo e, inclusive, no Brasil. Esses institutos foram simplesmente cancelados. Tudo isso, na minha opinião, porque faltaram discussões abertas com outras entidades, como OAB, Ministério Público e a própria Justiça”, finalizou.

O seminário “A Reforma do Código Penal em debate” segue até sábado, com 15 painéis compostos por personalidades jurídicas de várias partes do país. A programação completa das atividades está disponível aqui.

 

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