“Juiz não pode ser mero proferidor de sentenças”, diz ministra Fátima Andrighi

 
O Congresso Estadual de Magistrados, realizado no último final de semana, no Plaza Itapema Resort & Spa, em Itapema, contou em sua abertura com uma palestra proferida pela ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Fátima Nancy Andrighi. Em sua explanação, a ministra ressaltou que o papel do magistrado e o ato de julgar no mundo contemporâneo sofreram profundas modificações, as quais reafirmam a premissa de que a sociedade não tem como prescindir do trabalho feito pela Justiça. 
 
Por outro lado, apontou Fátima Andrighi, tais mudanças também obrigam a uma reflexão, na medida em que os juízes estão sendo pressionados a julgar cada vez mais, o que pode comprometer a qualidade dos julgados. “O juiz não pode ser mero proferidor de sentenças. O nosso papel é dar uma solução justa para dramas humanos”, ressaltou.
 
Na avaliação da ministra, as pressões da opinião pública pela ampliação do acesso ao Judiciário trouxe vantagens e desvantagens. “Se por um lado a sociedade evolui em termos de cidadania, por outro, as instituições judiciárias ficaram pequenas de repente. Me pergunto: como posso ser uma boa juíza se estou terminando de decidir sobre a guarda de uma criança e, no processo seguinte, devo decidir sobre royalties de sementes transgênicas e, em seguida, devo decidir se uma mulher solitária tem o direito de permanecer em seu apartamento com 20 cães ou apenas dois cães?”, questiona. 
 
Ela acrescentou que hoje os conflitos são muito mais complexos e as ações se multiplicaram em ritmo vertiginoso. “Contudo, o trabalho do juiz continua sendo absolutamente artesanal. Por isso é fundamental que se melhorem e ampliem as condições físicas, técnicas e intelectuais de trabalho do magistrado. São raros os ramos do Direito que permitem fazer uma pilha de processos e padronizar a sentença, a audiência”, frisou, acrescentando que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) poderia cumprir um importante papel como órgão de planejamento estratégico. “Será que não é hora de reivindicar ao CNJ o socorro que estamos precisando?”, indagou.
 
A ministra Fátima Nancy Andrighi (STJ) elencou, ainda, algumas premissas em relação ao trabalho do juiz: 1)ao juiz é proibido envelhecer. Pois envelhecer é considerar-se feito e acabado, sem necessidade de modificações. Envelhecer é a desistência dos novos desafios; 2) ao juiz cabe aplicar a lei e, ao mesmo tempo, dar-lhe um pouco de altruísmo, de caridade, equidade, pois é necessário aplicar a lei da forma mais humanizada possível; 3) ao juiz, é proibido proferir sentenças e aplicar brilhantemente a lei sem, no entanto, se preocupar com o destinatário dessa sentença; 4) ao juiz é proibido esquecer que os prazos processuais jamais correspondem aos prazos emocionais. Isso porque o processo não é apenas um conjunto de folhas de papel organizadas dentro de uma técnica processual. Mas sim, um reduto de no mínimo duas almas em conflito submetidas ao sempre desassossegado trâmite processual.
 
Por fim, a ministra destacou que o trabalho do juiz não é uma função, mas sim uma missão. “O futuro da jurisdição passa pela humanização dos serviços judiciais. Precisamos mudar essa feição de frieza, pois as figuras mais importantes da cena judiciária são as partes em conflito e seus sentimentos. Não haverá paz social se não alcançarmos a paz jurídica”, finalizou.
 
Livro
 
Logo após a palestra da ministra Fátima Nancy Andrighi, houve o lançamento do livro “Avida não é justa”, da juíza Andréa Pachá, do Rio de Janeiro. Em seu discurso, a magistrada enalteceu a proposta temática da AMC e destacou que a magistratura precisa, de fato, se aproximar mais da sociedade. “Não é mais possível tratar as críticas de forma refratária, como se tivéssemos uma reserva moral inatacável. O momento é extremamente rico, para debate, para trocas de experiências e vivências. A sociedade também tem muito a falar sobre o Judiciário e sobre justiça e nós podemos, por outro lado, dar a nossa valiosa contribuição”, concluiu. 
 

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