Juiz cria projeto para discutir integração entre ações do Judiciário e a Secretaria de Saúde

Por Carolina Pompeo

Foto: Gazeta de Joinville

Em uma audiência no início de 2011, o réu em questão não apenas admitiu a responsabilidade pelos crimes pelos quais era acusado, mas também pediu ajuda: chorando, disse não suportar mais a vida de dependência de drogas. Constatou-se que o sujeito era mesmo dependente químico, mas não tinha onde procurar ajuda e tratamento. A situação comoveu o Juiz João Marcos Buch, da comarca de Joinville, e escancarou uma realidade incômoda: o julgamento, a condenação e a prisão de pessoas que cometem crimes em decorrência do uso e do tráfico de drogas não é o suficiente para solucionar o problema. “Em conversa com o Promotor de Justiça, concluímos que é preciso mobilizar as autoridades da segurança pública e da saúde e dialogar para tratar o fenômeno da violência ligada às drogas em conjunto”, explicou Buch.

Com o objetivo de avaliar as dificuldades do Estado e do Judiciário em lidar com esse fenômeno, Buch decidiu criar o Conselho Gestor Integrado para Assuntos da Saúde e Segurança Pública. O grupo, que se reúne mensalmente desde 2011, é formado por Fernando Comim (Promotor de Justiça), Eduardo Luiz do Valle (Tenente Coronel do 8º Batalhão da Polícia Militar), Adilson Michelli (Tenente Coronel do 17º BPM), Dirceu Augusto Oliveira Júnior (Delegando Regional de Polícia de Joinville), Rodrigo Gusso (Delegado de Política Civil), Alvir Antônio Schneider (Secretário Municipal de Segurança Pública) e Cantalício Oliveira (Coronel da 5ª RPM). Segundo Buch, as reuniões possibilitam a aproximação e o debate entre os mais variados entes públicos, gerando uma comunicação e um esclarecimento mais efetivos.

Para o juiz, é fundamental que os órgãos oficiais de segurança e saúde pública e também a sociedade civil tenham acesso a informações que possibilitem a compreensão da violência originária do envolvimento com drogas. Ao contrário do que estabelece o senso-comum, o simples encarceramento daqueles que cometem algum crime em conseqüência da dependência química não surte o efeito desejado.

“Se compreendermos o fenômeno das drogas como uma questão de saúde pública e constatarmos que a política repressiva na América Latina e América do Norte não tem surtido efeito, o resultado, inclusive apontado pela criminologia atual, é a necessidade de aplicação de penas alternativas. Essas penas podem ser desde a prestação de serviços a comunidade com efetivo acompanhamento psicológico até o tratamento ambulatorial via Caps-AD”, explica Buch.

No fim de 2011, o Conselho elaborou um protocolo de encaminhamentos para definir alguns procedimentos em casos de prisões envolvendo uso de drogas. O ajuste final das medidas efetivas foi feito pelo Juizado Especial Criminal diretamente com o Caps-AD Joinville e as Polícias Militar e Civil. A proposta central é promover ações integradas entre o Judiciário e a Secretaria de Saúde, assim, o Caps-AD passa a receber informações sobre usuários de substâncias ilícitas que forem encaminhados ao juizado criminal. Em posse dessas informações, uma equipe contatará o usuário para lhe explicar e oferecer os serviços de atendimento disponíveis.

A ideia é que essa iniciativa de ir até o usuário seja um incentivo para que ele adira ao tratamento. Além disso, todas as informações a respeito do tratamento serão repassadas pelo Caps-AD e constarão no Termo Circunstanciado. Segundo o coordenador do centro, o psicólogo social Nasser Barbosa, o protocolo segue em funcionamento e representa grandes parcerias e avanços no sentido de tornar o acesso de algumas pessoas aos serviços oferecidos mais ágil e menos moralizante.

Barbosa também ressalta que o Caps-AD apóia irrestritamente todos os projetos que objetivam aprofundar a discussão sobre a violência associada ao consumo de drogas. “O projeto do Dr. João Marcos é muito rico nesse sentido e sempre que somos convidados, somamos com a discussão técnica a partir do nosso conhecimento empírico sobre a doença da dependência química”, diz.

De acordo com Buch, após algumas reuniões, constatou-se que, a exemplo do trabalho realizado pelo Caps-AD, havia muitas casas terapêuticas particulares dedicadas ao atendimento do mesmo público, mas carentes de recursos humanos capacitados. Assim, por meio da Secretaria de Estado da Saúde, o Conselho realizou em agosto desse ano o I Seminário Regional sobre Álcool e Drogas, com o tema: “A política de álcool e drogas nas três esferas de governo: em busca de soluções”.

O objetivo do evento era prestar esclarecimentos sobre políticas públicas que visam a solução de toda sorte de problemas advindos do consumo de álcool e drogas e orientar sobre a captação de recursos a partir da regularização das casas terapêuticas particulares. Cerca de 400 pessoas inscreveram-se, entre servidores públicos da saúde de vários municípios próximos a Joinville, assistentes sociais, psicólogos e demais profissionais que atuam em casas terapêuticas públicas ou privadas.

Além da capacitação, aconteceram cinco palestras, com o Secretário de Estado da Saúde, Dalmo Claro de Oliveira, que expôs o projeto do governo para resolver a problemática da violência ocasionada pelo consumo e tráfico de drogas; com o juiz-corregedor Alexandre Takaschima, sobre a visão do Judiciário a respeito do mesmo tema; com o coordenador do Caps-AD Joinville, Nasser Barbosa; com o Psiquiatra do Hospital de Custódia e Tratamento e, por fim, com servidora da Secretaria de Estado da Saúde.

Para Buch, o resultado final do evento foi muito positivo. “Não apenas pela capacitação que oferecemos àquelas pessoas que atuam nessa área, mas porque a grande procura por inscrições demonstra como o tema é importante para a sociedade e como há pessoas preocupadas e empenhadas em trabalhar no enfrentamento do problema”, avaliou. Diante da repercussão positiva, o magistrado adianta que outros eventos semelhantes serão realizados em breve.

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