Magistrado lança livro onde defende a múltipla filiação nos registros de nascimento

Por Suélen Ramos

O Juiz Maurício Cavallazzi Póvoas, da comarca de Joinville, lança, em setembro, o livro “Multiparentalidade: a possibilidade de múltipla filiação registral e seus efeitos”, resultado de sua dissertação de mestrado em Ciência Jurídica, apresentada em 2009 na Univali.

De acordo com o magistrado, a pesquisa foi instigada, inicialmente, pelo dilema que se instaura quando nem o pai biológico e nem o afetivo – de criação – abrem mão de sua condição paterna. Esses casos fizeram o autor levantar a seguinte questão: o que impede de dar a ambos o status de pai/mãe e fazer constar isso no registro de nascimento?  O autor também aponta casos em que a dupla paternidade pode ser uma alternativa para evitar que o pai afetivo ou o filho sejam prejudicados com a descoberta de um pai biológico.

“No livro eu defendo a possibilidade da dupla filiação levando em conta os laços de afetividade e não somente a questão biológica”, explica o autor, que dedica algumas páginas do livro para mostrar que nas ações de filiação, tanto para o reconhecimento como para negação de paternidade ou maternidade, a justiça passou a analisar os casos considerando não somente o exame de DNA, como também os princípios da dignidade da pessoa humana e da afetividade, que tornaram o Direito de Família menos burocrático e mais humano.

O Juiz Maurício Cavallazzi Póvoas cita no livro o caso descrito pela psicóloga Fernanda Otoni de Barros, em artigo intitulado “Do Direito ao Pai: Sobre a paternidade no ordenamento jurídico, em que a Justiça de Minas Gerais decidiu, após exame de DNA, pelo registro do pai biológico na certidão de nascimento de uma menina e, conseqüentemente, pela retirada do nome do pai de criação, após a mãe da criança entrar com ação na justiça, exigindo o reconhecimento do pai biológico. A intenção da mãe era garantir que a filha fosse beneficiada pelos recursos financeiros dos quais o pai “verdadeiro” dispunha.

O autor do livro destaca que a decisão judicial prejudicou o pai afetivo, que teve seu nome retirado do registro de nascimento de sua filha e também a criança, que apesar da forte ligação que tinha com o homem que a criou, passou a carregar o nome do pai biológico em seu registro de nascimento. Além disso, a criança foi afastada do convívio com o pai de criação, após o divórcio de sua mãe com o mesmo. Póvoas considera que a melhor solução para o caso seria o reconhecimento concomitante das paternidades biológica e afetiva. Dessa forma, a criança não seria privada do convívio com o pai afetivo e teria direito à pensão e herança do pai biológico.

Nas pesquisas que realizou para a confecção de sua dissertação, trabalho feito durante dois anos e meio, o magistrado constatou que a legislação brasileira não vetava o registro múltiplo e, por isso, seria possível que a prática fosse adotada para solucionar casos como o que ele julgou, no município de Concórdia, quando um rapaz de 18 anos solicitou que o nome de seu pai afetivo fosse retirado de seu registro de nascimento, após descobrir que o pai biológico tinha boas condições financeiras.

“Mas na época eu não autorizei o pedido, porque nesse caso eu entendi que o pai que o havia criado até então tinha o direito de continuar sendo seu pai, já que o vinha mantendo de maneira digna. Hoje entendo que não precisaria ter feito essa escolha se enxergasse a possibilidade de incluir o pai biológico no registro do rapaz, considerando que esse filho também tinha o direito de usufruir da boa condição financeira do novo pai”, ressalta.

O Juiz Maurício Cavallazzi Póvoas analisa todos os pontos que envolvem o registro múltiplo, passando pela guarda compartilhada, pensão alimentícia, direito à visita, sucessão, parentesco e nome. Na questão da guarda da criança, por exemplo, a afinidade seria o principal aspecto levado em conta pelo juiz, na hora da decisão. “Na legislação brasileira o princípio do melhor interesse da criança ou adolescente é garantido constitucionalmente e o Juiz consideraria esse aspecto também para casos de múltipla filiação”, explica o magistrado.

O autor do livro desconhece a existência de registros de nascimento com mais de um pai ou mãe em Santa Catarina, mas afirma que em São Paulo houve um caso em que a madrasta da criança foi incluída em sua certidão, após o falecimento da mãe biológica. O livro “Multiparentalidade: a possibilidade de múltipla filiação registral e seus efeitos” será lançado pela editora Conceito, na livraria Mídias, em Joinville, no dia 19 de setembro.

 

 

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