Esta semana, Magistrados de todo o país estarão reunidos em Florianópolis (SC) na 51ª edição do Fórum Nacional dos Juizados Especiais (Fonaje), que será realizada no Tribunal de Justiça de Santa Catarina. O objetivo do evento é debater sobre os desafios para aprimorar o serviço jurisdicional prestado pelos Juizados Especiais – área de atenção entre os Magistrados catarinenses.
Santa Catarina conta com 128 Juizados Especiais – 35 exclusivos e 93 vinculados a outras varas. O objetivo dessas unidades é promover Justiça com base nos critérios da simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, tendo como base a conciliação. O coordenador da Coordenadoria Estadual do Sistema dos Juizados Especiais e do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Cojepemec), Desembargador Silvio Dagoberto Orsatto, destaca que esta edição do evento vai abordar a padronização de entendimentos e os desafios da estrutura do sistema.
Hoje, os Juizados Especiais são responsáveis por cerca de 20% do volume de entrada de novos processos no Poder Judiciário de Santa Catarina. No ano passado, essa demanda representou, em números absolutos, 274 mil novos casos ingressantes – num acréscimo de 14%, comparado a 2021. Apesar da crescente entrada, o número de ações julgadas também aumentou cerca de 20%– foram 219 mil em 2021 e 262 mil em 2022, segundo dados da Corregedoria-Geral da Justiça do PJSC.
O cenário de crescimento no número de julgamentos neste âmbito da Justiça catarinense demonstra o esforço da Magistratura para garantir o princípio da celeridade. No 2º Juizado Especial Cível de Joinville, por exemplo, foram recebidos 3,4 mil novos processos e julgados 3,7 mil no ano passado. A unidade, onde atua o Juiz Gustavo Marcos de Farias, registra acervo atual com pouco mais de 2 mil litígios. “Acredito que o principal desafio enfrentado é conciliar o volume diário de trabalho, com os princípios norteadores do sistema, em especial, a celeridade. A sociedade moderna clama por uma justiça rápida e eficaz e temos que ser capazes de nos adaptarmos a essas mudanças de paradigmas”, justifica o Magistrado. Já o 3º Juizado Especial Cível de Joinville, sob responsabilidade do Juiz Gustavo Aracheski, tem 1,6 mil processos, também com número de julgamentos levemente superior ao de entradas.
Em Chapecó, o 2º Juizado Especial Cível tem acervo de 1,9 mil processos, sendo que o Juiz Juliano Serpa, responsável pela unidade, profere 280 sentenças por mês, em média. Na mesma região, a Vara Única de Ponte Serrada, sob responsabilidade do Magistrado Rômulo Vinícius Finato, é uma das 93 unidades de Santa Catarina que absorvem, também, a demanda dos Juizados Especiais. A unidade tem um acervo de 5,3 mil processos, sendo que 14% deles tramitam no sistema do Juizado Especial.
O volume de ações registradas no Juizado Especial Cível do Foro Distrital do Continente, em Florianópolis, onde atua o Juiz Fernando Vieira Luiz, se mantém equilibrado. São recebidos 300 novos litígios por mês e a média de julgamentos é a mesma. “Esse resultado mostra que a rotatividade é grande e a tramitação é relativamente rápida. Precisamos lidar com um grande volume de processos e, manter a celeridade processual, conciliando a necessidade de uma análise cuidadosa dos casos com a eficiência na resolução dos litígios”, justifica.
O Desembargador Orsatto, coordenador da Cojepemec, acredita que, para além da celeridade dos julgamentos, é preciso pensar numa mudança cultural em relação a solução de conflitos.
“Os recursos e a estrutura são decisões políticas, contudo superar o atual nível de beligerância, os interesses escusáveis e, em especial, a matriz litigiosa são os grandes desafios das políticas públicas judiciárias de desjudicialização e promoção de meios adequados à solução de conflitos”, argumenta Sílvio Orsatto.
Cultura da conciliação é o desafio
Os Juizados Especiais foram criados em 1995 e nestes 28 anos popularizou-se como uma porta de acesso à Justiça mais simples e rápida. “O procedimento do Juizado foi pensado e desenvolvido para que os envolvidos consigam, eles próprios, chegar ao acordo e resolver o problema de maneira mais justa e equilibrada, o que muitas vezes não é possível atingir pela sentença judicial”, explica o Juiz Gustavo Aracheski.
Apesar do evidente benefício previsto na abordagem dos Juizados Especiais, para os Magistrados é constante o desafio de fomentar a solução consensual de conflitos. “É inegável que a confiança na Justiça é um fator que estimula a Judicialização, mas outros remédios, além do processo judicial, como a arbitragem e as câmaras de conciliação, sequer são lembrados pelos litigantes. Assim, o excesso de demanda provoca a morosidade do processo”, aponta o Desembargador Silvio Orsatto.
Rômulo Vinícius Finato acredita que o fortalecimento dos Juizados deve começar na formação acadêmica dos operadores do Direito, para que compreendam como as técnicas sumárias contribuem para a solução de conflitos.
“Há uma compreensão pela sociedade e alguns operadores do Direito de que os Juizados Especiais seriam uma justiça de menor importância. Tal fato reflete a tendência de uma ordinarização do procedimento sumaríssimo, em contraposição aos preceitos norteadores dos Juizados Especiais, sobretudo da informalidade e celeridade”, destaca Rômulo.
Juliano Serpa concorda que a ordinarização do procedimento e a pouca composição entre as partes são fatores que influenciam para que os Juizados nem sempre ofereçam uma resposta célere. “Além disso, tem-se uma estrutura do sistema dos Juizados Especiais deficitária, mesmo possuindo uma parcela considerável do acervo dos processos em tramitação no Poder Judiciário de Santa Catarina”, acrescenta.
“Estamos ainda muito presos à cultura da sentença. É um desafio diário estimular partes, procuradores e a comunidade jurídica em geral para a importância e eficiência das formas alternativas de resolução de controvérsias”, destaca o Juiz Fernando vieira Luiz. O Magistrado vê no uso da tecnologia uma alternativa para superar as limitações de estrutura dos Juizados Especiais: “A incorporação de recursos tecnológicos no apoio ao atendimento ao público bem como no próprio trâmite processual, inclusive o uso de inteligência artificial como mecanismo de apoio a todos os colaboradores”, sugere.
O Juiz Juliano Serpa reforça que a promoção desta desejada mudança cultural deve estar aliada a uma estruturação das unidades jurisdicionais. “Dessa forma teremos cada vez mais um sistema de Juizado Especial forte, o qual continuará a cumprir com seu papel constitucional de entrega célere e efetiva da prestação jurisdicional”, finaliza.
Turmas de Recursos ajudam a reduzir acervo de processos
Até 2019, os recursos oriundos dos Juizados Especiais eram julgados em Turmas de Recursos regionais, compostas por Magistrados em regime de mandato e cumulação. As Turmas de Recursos foram reestruturadas e, a partir de 2020, passaram a contar com 12 julgadores exclusivos. O grupo, dividido em três turmas, começou o trabalho com um acervo de 56 mil processos. Após três anos, em fevereiro de 2023, o acervo já tinha diminuído para 28 mil processos.
Para o Magistrado Antônio Augusto Baggio e Ubaldo, que atua na 3ª Turma, a mudança permitiu uma melhor adequação do sistema recursal à realidade atual dos Juizados Especiais. “A massificação das demandas nos Juizados exige uma estrutura recursal específica e dedicada a essa nova realidade. A dedicação exclusiva e o acesso por cargo às Turmas de Recursos foram fundamentais para que o trabalho dos colegiados tenha alcançado um patamar ainda maior de eficiência do que já tinha anteriormente”, aponta.
A rotina de julgamentos nas Turmas de Recursos se assemelha à de uma câmara do Tribunal de Justiça, porém, e como é típico do Sistema dos Juizados Especiais, com um grau maior de simplicidade e informalidade. “A decisão colegiada implica uma segurança maior, pois são três juízes a analisar em grau de recurso um processo já decidido em primeiro grau, e ao mesmo tempo uma responsabilidade maior, pois é a última instância de cognição completa, inclusive de fatos e provas”, conclui Ubaldo.
Em Santa Catarina, atuam nas Turmas de Recursos os Magistrados: Marcelo Pons Meirelles, Davidson Jahn Mello, Paulo Marcos de Farias, Luis Francisco Delpizzo Miranda, Marco Aurélio Ghisi Machado, Margani de Mello, Maurício Cavallazzi Póvoas, Alexandre Moraes da Rosa, Antonio Augusto Baggio e Ubaldo, Jaber Farah Filho e Adriana Mendes Bertoncini.
Contratação de Juízes leigos busca acelerar a solução de processos nos Juizados Especiais
Este ano foram nomeados 30 Juízes leigos para atuar nos Juizados Especiais do TJSC. Eles são responsáveis por realizar audiências de conciliação, atuar na resolução de conflitos como árbitros, promover a instrução do processo e até elaborar minutas de sentença no sistema de Juizados Especiais, depois submetidas ao Juiz togado. A função pode ser desempenhada por advogados, com mais de dois anos de experiência jurídica.
“A incorporação destes juízes leigos representa o maior passo da Justiça catarinense para o aprimoramento dos Juizados Especiais nas últimas três décadas. Em nenhum outro momento, apesar de louvadas todas as iniciativas anteriores, o sistema dos Juizados Especiais foi contemplado com tamanho incremento de recursos e estrutura em um prazo tão curto”, destaca Silvio Orsatto.