O castigo de Deus dispensa a punição do Estado


Por Luiz Fernando Boller, Juiz Diretor do Foro de Tubarão-SC.

Recentemente (em 13.04.2006), um menino de um ano e três meses morreu asfixiado, com queimaduras de primeiro e segundo graus, após ficar cinco horas dentro de um carro na Vila Mazzei, zona norte da capital paulista.Segundo a Secretaria de Segurança Pública, o pai o esqueceu dentro do veículo.

A perda do bebê – filho de Carlos Alberto Legal Filho, 35 anos – determinada por uma imprudência sua, constitui-se em dor sentimental, a afligi-lo tão intensamente que dispensa a execução da pena, visto que representa sofrimento moral dos mais significativos, ainda mais quando causada por ato culposo de tão descuidado pai.O falecimento do nenê constitui uma lamentável fatalidade, onde resultou como vítima a criança que ficou mais de cinco horas dentro de um Fiat Siena, no estacionamento da academia de ginástica onde o pai trabalhava. Sem dúvida, Carlos Alberto ficou abalado com o ocorrido – a morte de seu filho – o que demonstra dor e sofrimento intenso. As conseqüências dolorosas, amargas, aflitivas, são uma pena de Deus ou uma pena do destino que dispensa a do Estado, para que não mais sofra quem tanto já sofreu com o erro da conduta. E não se pode esquecer que, muitas vezes, a dor moral – representada pelo remorso – supera, e muito, a um padecimento físico.

A notícia nos meios de comunicação demonstrou que as conseqüências do homicídio culposo atingiram o pai, de forma veemente, tornando desnecessária qualquer sanção que se lhe aplique, razão pela qual entendo que lhe deva ser concedido o perdão judicial (previsto no art. 121, § 5º, e art.107, IX, do  Código Penal), assim para, pelo menos, amenizar o sofrimento que Carlos Alberto Legal Filho padeceu após o fato e sofrerá durante toda a tramitação do inquérito no 20º Distrito Policial de São Paulo capital – e conseqüente processo-crime – visto que indiscutível a angústia que suportará durante toda sua vida, e dor que, com inegável certeza, superará qualquer punição estatal. O benefício do perdão judicial tem cabimento em todas as hipóteses em que o sofrimento do agente – quer físico, quer moral – supere a possível sanção judicial, a ponto de esta última ser de nenhuma valia para a sociedade. Não se pode esquecer que, muitas vezes, a dor moral, representada pelo remorso, supera, e muito, a um padecimento físico.

O Judiciário poderá conceder o perdão se as conseqüências da infração atingirem o próprio Carlos Alberto de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. Trata-se de punição do agente pelo destino. A concessão do benefício constitui a aplicação do princípio de que o homem é punido pelo próprio fato que praticou. As conseqüências podem ser morais (a morte do bebê, seu próprio filho, a quem era ligado por laços afetivos e de sangue). É a concretização legal do princípio de que o fato pune pelo homem, segundo o qual a pena do Estado se  torna desnecessária quando o próprio fato se incumbiu da punição do agente, descarregando sobre ele todas suas conseqüências. Esta – quando dolorosa, amarga e aflitiva – é uma pena de Deus ou uma pena do destino, que dispensa o castigo, a punição do Estado, para que mais não sofra quem tanto já sofreu com o erro da conduta.

O benefício nada mais é que a punição que o próprio destino impõe ao homem que causa a morte de seu filho – o desditoso bebê – eis que já foi suficientemente punido pela ausência do próprio descendente, pela inquietação da consciência, pela culpa, pelo remorso etc. A concessão do perdão é uma salutar medida, podendo o Estado plenamente desistir da sua pretensão punitiva, uma vez que inócua e descabida se torna.

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