Desembargador acredita que proposta de redução da maioridade penal pode elevar índices de criminalidade

O coordenador da Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude (CEIJ), Desembargador Sérgio Izidoro Heil, também se manifestou sobre o projeto de redução da maioridade penal, que tramita na Câmara dos Deputados. Em entrevista à Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC), o Magistrado reafirma o seu posicionamento contrário à proposta, por entender que a mudança não contribuirá para a redução da violência e da criminalidade. Para ele, ampliar a repressão não vai resolver o problema e que é preciso apostar na prevenção das condutas, com foco na proteção dos direitos das crianças e adolescentes.

Confira, abaixo, a íntegra da entrevista com o Desembargador Sérgio Heil:

1 – O sr. é a favor ou contra a redução da maioridade penal? Por quê?

Sou contrário à proposta por entender que o objetivo final da mesma – diminuição dos índices de criminalidade – não será alcançado com essa medida. Em verdade, estes índices podem até piorar com a medida. Tudo isto porque a quantidade de atos infracionais praticados por adolescentes representa percentuais ínfimos dos atos ilícitos cometidos no país, de modo que o encarceramento daqueles não contribuiria significativamente para pacificar a sociedade e, por outro lado, ainda acarretaria uma série de consequências negativas, ligadas à colocação dos jovens no sistema prisional, centro do crime organizado no país.

A Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude, da qual faço parte como coordenador, já resumiu outras várias razões para revelar seu descabimento:

1) é desnecessária, por já existirem instrumentos legais para responsabilização dos jovens desde os 12 (doze) anos de idade, adequados à situação de pessoa em desenvolvimento, inclusive com possibilidade de restrição da liberdade;

2) é inútil, pelo aspecto da repreensão e prevenção penal, pois a maioria dos delitos não tem autoria desvendada pelo Estado e pelo fato de que o simples endurecimento das sanções criminais não contribui decisivamente para a redução da criminalidade;

3) é inconstitucional, pois a maioridade penal é cláusula pétrea, de caráter imutável, além de atentar contra tratados dos quais o Brasil é signatário.

Este posicionamento também é compartilhado pelo Colégio de Coordenadores da Infância e Juventude. Também é preciso lembrar que a grande maioria dos países fixa a responsabilidade penal na idade de 18 (dezoito) anos. Segundo dados da ONU, quase 80% (oitenta por cento) das nações adota este patamar como o mínimo para aplicação de sanções penais.

2 – O sr. considera que a proposta de redução da maioridade penal, caso seja aprovada, vai contribuir para a diminuição da criminalidade e da violência do país?

Não. Como dito, a quantidade de atos infracionais praticados no país é extramente menor que a quantidade de crimes, de condutas praticadas por pessoas penalmente imputáveis; logo, mesmo que a medida tivesse o efeito de erradicar integralmente o cometimento dos atos infracionais, ainda assim a violência permaneceria inalterada. Além disso, penso que o aprisionamento conjunto de adultos e jovens permitiria o recrutamento destes últimos para a prática de delitos após a libertação, pois o crime organizado se vale do sistema prisional para esta finalidade.

Nessa perspectiva, é até possível que a medida, supostamente com vistas à redução da criminalidade, possa ensejar seu recrudescimento.

3 – O que é preciso fazer para reduzir a prática de ilícitos por adolescentes?

A solução da questão não está na repressão, mas na prevenção das condutas. É preciso que se dê integral cumprimento à própria Constituição, que confere à criança, ao adolescente e ao jovem “absoluta prioridade” na garantia dos direitos à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer e à dignidade, dentre outros, e na salvaguarda dos mesmos em face da negligência, da exploração, da violência, da crueldade e da opressão. Em suma, é preciso que a sociedade e, em especial, o Estado, entendam que a formação de crianças e adolescentes mental e fisicamente saudáveis é indispensável para o sadio desenvolvimento do tecido social, com o consequentemente afastamento dos mesmos dos caminhos do crime na idade adulta.

A materialização destes direitos somente será alcançada quando existirem investimentos maciços em sua asseguração, especialmente com o redirecionamento dos recursos públicos perdidos por mau uso e por desvios de toda sorte. Somente assim se conseguirá que o jovem e o adolescente não sejam expostos à violência e tenham possibilidade de desenvolver integralmente suas potencialidades, com perspectiva de futuro.

 

 

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