Britânico Mick Pease debate acolhimento familiar em São Bento do Sul

Grupos do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Paraná e de várias cidades de Santa Catarina participaram, no último dia 22, em São Bento do Sul, da palestra com o inglês Mick Pease, fundador do Serviço de Famílias Acolhedoras no Reino Unido (SFAC), considerado uma referência mundial em acolhimento familiar de crianças e adolescentes. O evento foi uma realização do Poder Judiciário da Comarca de São Bento do Sul, Grupo Gerando Amor – Grupo de Estudos e Apoio à Adoção e à Convivência Familiar e Secretaria de Assistência Social.

O Juiz Edson Luiz de Oliveira, titular da 2ª Vara da comarca de São Bento do Sul e um dos entusiastas do projeto, destacou a importância do debate e da troca de experiências: “O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) coloca os orfanatos e abrigos como segunda opção. O acolhimento familiar precisa ser prioridade e, por isso, a importância do evento: de mobilizar a sociedade e transferir responsabilidades. Nosso objetivo é oferecer às crianças e adolescentes a esperança de uma dinâmica familiar, inexistente nos orfanatos”, pontuou.

Ainda de acordo com Oliveira, as atividades realizadas nos últimos anos têm demonstrado eficácia em atingir o objetivo maior de divulgar as causas ligadas à adoção e ao acolhimento familiar. "Graças aos esforços de todos os envolvidos em sua realização, tais eventos irradiaram fortes e sentidos efeitos, chamando a atenção da comunidade local e regional para o tema, alcançando assim os objetivos das suas promoções", assinalou o Magistrado.

Durante a palestra, o britânico ressaltou a importância de se colocar o direito da criança acima dos demais interesses ou receios. Contou que, na Inglaterra, crianças com menos de 10 anos, em situação de risco, não podem ser levadas para instituições, mas são acolhidas por famílias.  Em 1997, ele morou um ano em São Paulo, para conhecer de perto a realidade brasileira. “Naquela época, me diziam que o sistema de acolhimento familiar não funcionaria no Brasil, porque as pessoas são muito sentimentais e não suportariam o momento de afastamento das crianças e adolescentes na volta à família de origem”, afirmou Pease. “Hoje, várias cidades, a exemplo de São Bento do Sul, adotam o acolhimento familiar”, completou. Ele aponta que o mesmo receio é observado em outros países.

Escutar e compreender o que as crianças têm a dizer sobre a vivência em uma família acolhedora é essencial, na opinião de Pease. “Na Inglaterra, quando se escutam as crianças, normalmente elas reclamam de que Juízes e Assistentes Sociais não levam em consideração o que elas sentem”, sublinhou.

O Juiz Edson Luiz de Oliveira informou que, atualmente, São Bento do Sul conta com 17 famílias cadastradas no Programa de Acolhimento Familiar, das quais nove estão acolhendo 10 crianças. Ele destacou, ainda, o trabalho conjunto entre administração municipal, Judiciário e o Grupo de Voluntários Gerando Amor para assegurar o êxito do acolhimento familiar no município, iniciado há 13 anos.

Como funciona o Programa de Acolhimento Familiar

O acolhimento tem o intuito de proteger a criança e adolescente que esteja em situação de risco e que, eventualmente, precise se afastar do convívio familiar. Várias razões podem motivar o acolhimento, como por exemplo, quando um dos pais estiver cumprindo pena, hospitalizado ou ser autor de alguma violência doméstica, seja sexual, psicológica ou de negligência.

A medida foi criada como uma alternativa diferente ao encaminhamento para abrigos, onde estas crianças e adolescentes são tratados em uma abordagem coletiva. Já com a família acolhedora, eles podem receber um maior respeito à sua individualidade. Este vem sendo um dos desafios de muitos abrigos, que procuram adotar formas mais acolhedoras e individualizadas de atendimento.

De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a medida deve ser considerada como um programa de acolhimento familiar formal e que não se trata de uma transferência de guarda simples a uma família qualquer, ou seja, ela tem que ser formalizada e não pode ser aplicada sem o acompanhamento de profissionais da área. As famílias que acolhem as crianças ou adolescentes devem passar por uma capacitação e seleção que avaliará suas condições para o acolhimento. Durante o processo, a família acolhedora e a criança acolhida devem receber contínuo acompanhamento por equipe técnica e multidisciplinar.

Em torno de 372 municípios, em 19 Estados, apresentam programas de acolhimento familiar para crianças separadas temporariamente da família de origem e a maior parte se localiza nas regiões Sul e Sudeste, especialmente nas cidades de Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Currículo

O inglês Mick Pease é reconhecido como uma das maiores autoridades mundiais no assunto e percorre todos os continentes para disseminar suas experiências e seu vasto conhecimento sobre o tema, oportunidades em que auxilia e treina governos e organizações não governamentais em alternativas de cuidados para crianças e adolescentes afastados da base familiar.

Assistente Social qualificado e registrado no Reino Unido, ele atuou no governo local e na cidade de Leeds desde 1984 em Proteção à Criança, Acolhimento Familiar, Cuidado Parental e Adoção (doméstica e internacional). Continua a trabalhar nessa área oferecendo consultoria e é fundador e diretor da SFAC (Famílias Substitutas para Crianças Abandonadas, na sigla em inglês), uma ONG registrada no Reino Unido. Viaja para muitos continentes (22, na última contagem) auxiliando governos e ONGs através de consultoria e treinamento em alternativas de cuidados de base familiar para instituições de cuidado à criança que não está em condições de viver com seus pais.

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